quinta-feira, 5 de novembro de 2020

A revitalização da democracia?

 

O sistema norte-americano para a escolha do presidente da República é singular, sob a adoção do chamado colégio eleitoral, em que cada estado ganha um peso nesse critério eleitoral, de acordo com o tamanho da sua população.

Na eleição de 2016, por exemplo, a candidata democrata teve mais votos, acima de três milhões, mas o eleito foi o atual presidente, exatamente porque ele fez mais votos no colégio eleitoral, que é formado para o eleger, em votação apenas pro forma, posto que o vitorioso é aquele que fizer mais delegados nesse colegiado.

Nesse sistema visivelmente anacrônico, por se permitir          que a vontade popular seja ignorada, não é novidade que o candidato menos votado nas urnas venha a se eleger, exatamente por ele ter conseguido fazer mais votos no colégio eleitoral.

Naquele país, o colégio eleitoral totaliza 538 votos e o candidato a presidente precisa conquistar a maioria dos votos dos delegados, que é a metade dessa quantidade mais um, no somatório de 270 delegados.

Ou seja, o sistema é formatado para que os eleitores norte-americanos votem, na verdade, para a escolha dos delegados do partido, que, depois, vão eleger o presidente do seu partido, no caso da formação da maioria dos delegados.

O colégio eleitoral é formado proporcionalmente à quantidade de habitantes, onde há estado com 55 delegados e outros com 3, 6, 10 e assim por diante, conforme a população.

Como a Califórnia, por exemplo, é o estado mais populoso do país, com quase 40 milhões de habitantes, ela está dividida em 53 distritos eleitorais e termina se tornando grande força para a eleição do presidente.

Já o estado do Kansas, que é pequeno, com menos de 3 milhões de habitantes, tem apenas quatro distritos eleitorais, ou seja, esse estado oferece 4 delegados para a eleição do presidente.

Em cada distrito do estado corresponde a um delegado, ao qual se acrescenta mais um para cada senador que possui no Congresso, no total de dois, caso em que, na Califórnia, o total de delegados é de 55 e, no Kansas, de seis delegados, fato que evidencia a clara influência de cada estado, exatamente pela quantidade de votos no colégio eleitoral.

O sistema prevalente do colégio eleitoral existe justamente para que estados mais populosos tenham peso maior na decisão e, ao mesmo tempo, obrigando que os candidatos intensifiquem esforços tanto mais para ter melhor desempenho nos estados como Califórnia, Flórida e Texas, por exemplo, que, no conjunto, somam 133 delegados, que é quase 25% do total dos delegados e quase a metade para a eleição de presidente, no total de 270.

À exceção apenas dos estados de Maine e Nebraska, nos demais estados, é adotado o sistema denominado de  winner-take-all, em que o ganhador leva tudo, no caso onde o candidato que conseguir o maior número de delegados fica com todos, ou seja, se alguém conquistar 28 ou mais dos delegados da Califórnia, por exemplo, significa que ele contabiliza o total dos 55 delegados.

Via de regra, existem estados que são tradicionalmente republicanos, enquanto há outros onde os democratas ganham praticamente sempre, a briga se volta mesmo para os demais estados conhecidos como swing states, onde não há tanta fidelidade e os resultados variam de acordo com cada eleição.

Nessa sistemática, se incluem Carolina do Norte, Ohio, Pensilvânia e mesmo a Flórida, que passam a ser decisivos, no final da contagem dos votos.

Ao final, com o somatório dos 50 estados dos Estados Unidos da América (mais o distrito de Columbia), existem 538 delegados em disputa, e se torna presidente o candidato que assegurar o voto de pelo menos 270 deles.

Esse sistema de votação já bastante complexo, mas, desta vez, ele se tornou ainda mais, diante dos contornos da imprevisibilidade da pandemia do novo coronavírus, em que foi permitida a votação pelos correios.

Com a pandemia ainda presente nos Estados Unidos, assim como em boa parte do mundo, o tradicional sistema de votação do país precisou ser reformulado, para que os norte-americanos pudessem depositar suas cédulas pelos correios.

Parece inimaginável que, em plena era da inteligência artificial, a economia mais poderosa do mundo ainda recorra ao antigo sistema de envio, mas o processo eleitoral norte-americano é considerado um dos mais democráticos do mundo.

Na verdade, esse fato suscitou questionamentos, em especial do atual presidente, que não se conforma com essa ideia, por entender que ele pode beneficiar seu adversário, fato este que não há a menor procedência, por se tratar de decisão dentro das regras democráticas, válidas para ambos os candidatos, apenas adaptadas às circunstâncias.

Como o país da América do Norte possui forte influência nas decisões e rumos internacionais por conta da sua força econômica, neste período, as atenções ficam completamente voltadas para o pleito norte-americano.

Finalmente, importa se destacar que, nos EUA, não existe tribunal eleitoral, motivando que cada estado norte-americano tenha a incumbência e a liberdade para definir, previamente, as regras eleitorais, que podem ser diferentes das normas do último pleito de 2016 e até mesmo dos demais estados, conforme a conveniência deles.

Embora se diga que os Estados Unidos seja modelo de democracia, nesse ponto, o sistema eleitoral não parece ser o mais justo que se poderia imaginar, em termos democráticos, quando este tem por princípio a vontade popular, que não tem aderência nesse formato esdrúxulo e retrógrado, quando, nem sempre, a maioria elege o presidente, exatamente por força mais indireta, em que se vota para a formação de colegiado eleitoral e não diretamente no candidato.

Parece evidente que esse sistema complexo e pouco compatível com a realidade democrática, que é a materialização da vontade popular não se completa totalmente nele, diante dessa discrepância, atende plenamente aos interesses dos norte-americanos, por o aceitarem normal e continuamente.

A esperança é a de que o futuro presidente norte-americano, não importando se democrata ou republicano, tenha a sensibilidade de trabalhar tanto para o engrandecimento dos Estados Unidos da América como para a felicidade do mundo, diante da dependência econômica daquela que é, sem a menor dúvida, a maior potência, que consegue transmitir estabilidade e segurança universais quando seu governo demonstre serenidade e competência no comando daquela nação.

Brasília, em 5 de novembro de 2020  

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