quinta-feira, 26 de novembro de 2020

Prova da incompetência?

 

A Embaixada da China, em Brasília, reagiu à acusação do deputado federal filho do presidente da República, de que aquele país praticaria espionagem por meio de sua rede de tecnologia 5G.

A diplomacia chinesa entende que o parlamentar “solapou” a relação amistosa entre o Brasil e China, por ele ter feito declarações “infames”, tendo afirmado que o Brasil poderá “arcar com consequências negativas”.

Na mensagem, o filho do presidente fez menção à adesão simbólica do Brasil à Clean Network (Rede Limpa), iniciativa diplomática do governo norte-americano, para tentar frear o avanço de empresas chinesas no mercado global de 5G.

O filho do presidente celebrou aquele fato como um sinal de que “o Brasil se afasta da tecnologia da China. O governo Jair Bolsonaro declarou apoio à aliança Clean Network, lançada pelo governo Trump, criando uma aliança global para um 5G seguro, sem espionagem da China”.

Além de escrever o texto acima, o parlamentar também listou o Partido Comunista Chinês como “entidade agressiva e inimiga da liberdade”.

Imediatamente, a embaixada da China emitiu nota, afirmando que “Na contracorrente da opinião pública brasileira, o deputado Eduardo Bolsonaro e algumas personalidades têm produzido uma série de declarações infames que, além de desrespeitarem os fatos da cooperação sino-brasileira e do mútuo benefício que ela propicia, solapam a atmosfera amistosa entre os dois países e prejudicam a imagem do Brasil. Acreditamos que a sociedade brasileira, em geral, não endossa nem aceita esse tipo de postura. Instamos essas personalidades a deixar de seguir a retórica da extrema direita norte-americana, cessar as desinformações e calúnias sobre a China e a amizade sino-brasileira, e evitar ir longe demais no caminho equivocado, tendo em vista os interesses de ambos os povos e a tendência geral da parceria bilateral. Caso contrário, vão arcar com as consequências negativas e carregar a responsabilidade histórica de perturbar a normalidade da parceria China-Brasil.”.

O Clean Network tenta convencer governos estrangeiros, mais por meio de pressão política e até com oferta de financiamento, a somente permitir em suas redes 5G equipamentos de fornecedores não-chineses, que eles consideram “confiáveis”.

O governo norte-americano acusa as empresas de origem chinesa de serem obrigadas a permitir acesso do governo comunista a suas redes, o que supostamente abriria uma brecha para vigilância.

Os Estados Unidos pretendem que o Brasil decida banir a empresa Huawei como fornecedora, após o leilão do 5G, previsto para 2021, algo que ainda se encontra em estudos pelo Palácio do Planalto.

O governo chinês diz que a iniciativa do governo norte-americano “discrimina a tecnologia 5G da China”, enquanto a Huawei é uma das principais fornecedoras de estrutura de telecomunicações no Brasil, usada pelas maiores operadoras de telefonia, tendo por isso vantagens no entendimento de executivos do setor.

Não obstante, a China reage às ações do país de tio Sam, afirmando que “O governo chinês incentiva empresas chinesas a operar com base em ciência, fatos e leis enquanto se opõe a qualquer tipo de especulação e difamação injustificada contra empresas chinesas. Os EUA têm um histórico indecente em matéria de segurança de dados. Certos políticos norte-americanos interferem na construção da rede 5G em outros países e fabricam mentiras sobre uma suposta espionagem cibernética chinesa, além de bloquear a Huawei visando alcançar uma hegemonia digital exclusiva. Comportamentos como esses constituem uma verdadeira ameaça à segurança global de dados”.

A diplomacia reativa orientada pelo presidente chinês afirmou que as declarações do parlamenta brasileiro são “infundadas e prestam-se a seguir os ditames dos EUA no uso abusivo do conceito de segurança nacional para caluniar a China e cercear as atividades de empresas chinesas. Isso é totalmente inaceitável para o lado chinês e manifestamos forte insatisfação e veemente repúdio a esse comportamento. A parte chinesa já fez gestão formal ao lado brasileiro pelos canais diplomáticos”.

Como não poderia ser diferente, foi com preocupação que o governo brasileiro recebeu a reação natural do governo chinês aos ataques insanos, indevidos e intempestivos do filho do presidente brasileiro, diante da possibilidade de perda para o Brasil se houver crise diplomática com a China, que é o maior parceiro comercial brasileiro.

A maior gravidade de tudo isso é que, como filho do presidente do país, em muitos casos, há interpretação de que a fala dele pode se confundir ou estar refletindo o pensamento do próprio presidente, motivo pelo qual é preciso ter cuidado redobrado ao se referir a assunto que deve ser encaminhado pelos canais diplomáticos, que são as vias normais de negociações entre nações evoluídas e civilizadas.

O filho do presidente deixa visão muito clara que ele (que pode até ser o pensamento do Palácio do Planalto, por falta de informação) se alinha, em claro prejuízo aos interesses do Brasil, ao discurso do presidente americano e ainda acusa o Partido Comunista Chinês de pretender fazer  espionagem, o que nada disse se insere na sua precípua atividade parlamentar, salvo por ele ser integrante da família do mandatário tupiniquim, que também é totalmente impróprio, porque os assuntos de Estado devem ser tratados exclusivamente pelos órgãos competentes do governo.

A situação é tão ridícula que é como se o parlamentar estivesse falando em nome governo, mas ele não tem competência para tanto, para se pronunciar como se a mensagem realmente partisse da sede do governo, que, nesse caso, fica a impressão de que ele não tem coragem de se expor diretamente contra os interesses dos chineses, permitindo que o parlamentar se intrometa em assunto extremamente delicado, com o propósito apenas de tentar complicar as relações diplomáticas, de forma injustificável e desnecessariamente.  

Não há a menor dúvida de que se trata de equívoco fenomenal o Brasil querer manter esse debate ideológico contra a China e ainda por canal inapropriado, em sintonia automático com presidente norte-americano.

Não faz o menor sentido o Brasil querer adotar tom beligerante e antidiplomático na discussão da tecnologia 5G, que se trata de prioridade para os Estados Unidos, independentemente de governo.

Ainda na campanha presidencial, o candidato republicano tinha interesse estratégico, em termos políticos, para atacar fortemente a China, especificamente com relação à tecnologia 5G, ou seja, em momento de eleição americana, mas, ao contrário disso, nada justifica o Brasil entrar nessa briga de cachorros grandes, que tem a marca da ideologia entre extrema-direita e comunismo, porque ele só tem a perder se entrar nesse affaire, quando o ideal é o insensato filho do presidente se fingir que o Brasil sequer existe, deixando que essa questão fique a distância e seja tratada e resolvida pelo país do tio Sam, junto com a China.

No sentido estritamente diplomático, a nota da embaixada da China comete grave e grosseiro equívoco, quando considera a declaração do filho do presidente como se ela fosse do próprio governo, quando é visível o distanciamento entre um e outro, à vista de não haver absolutamente nada que possa se fazer, com segurança, tão absurda ligação, salvo pelo simples fato de o parlamentar ser filho do presidente da República, mas isso não significada nada, porque qualquer deputado poderia ter dito a mesma coisa e isso seria ridículo em se afirmar que ele estaria falando pelo Palácio do Planalto.

Não obstante, esse rapaz demonstra não ter a menor estatura intelectual, política nem diplomática, em que pese ele ter sido cogitado para ser embaixador brasileiro nos Estados Unidos, mas, apesar dos pesares, ele insiste em exercer o cargo de premiê tupiniquim, sem ter nenhum estofo para a função, que exige preparo,  capacidade, maturidade e responsabilidade.

A desastrada declaração do parlamentar chega a ser da maior prematuridade, principalmente porque ela pode ter implicação tanto diplomática como comercial, com substanciais prejuízos aos interesses nacionais, por meio de distanciamento de relações e dificuldade nas negociações entre os dois países.

Causa enorme perplexidade o silêncio do governo, nesse episódio, por ter o dever constitucional de defender os interesses nacionais, caso em que é preciso que haja imediata manifestação para refutar a declaração em tela, para se afirmar, de forma peremptória, que ela não condiz com a sua orientação.

Convém que o governo deixe claro que não se responsabiliza por posicionamentos pessoais, por meio dos quais nenhuma nação tem o direito de fazer inferência e muito menos ameaças em razão deles, ante a fragilidade do seu objeto, à vista de não haver absolutamente nada de concreto, nesse caso, que ligue as declarações, que foram pronunciadas por particular, por se tratar de parlamentar, com os interesses do Estado, com o que se pode concluir pela farta ingenuidade da embaixada da China, em pretender tratar a matéria em apreço como se fosse oriunda do governo brasileiro.

O filho do presidente teve tanta certeza de que havia cometido gigantesca besteira que a sua irresponsável declaração foi logo deletada, certamente por ele perceber que teria ido longe demais, ao se imiscuir em assunto bastante relevante da República que refoge à sua competência legislativa.

Os brasileiros esperam que o parlamentar se conscientize de que a importância do Brasil não admite a atitude impensada e irresponsável praticada por ele, que precisa se concentrar exclusivamente nas atividades pertinentes às relevantes funções parlamentares.

O governo brasileiro precisa mostrar firmeza nesse caso e em todos os outros que envolverem os interesses nacionais, no sentido de adotar posição clara e objetiva sobre a sua autoridade acerca de assuntos que competem exclusivamente ser tratado por ele, procurando esclarecer que as posições e manifestações de interesse do Estado são tratados diretamente pelo presidente da República e pelos órgãos competentes, ficando muito claro que ninguém mais tem autorização para fazer declarações sobre assuntos vinculados à administração dos negócios do Brasil.

Brasília, em 26 de novembro de 2020  

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