domingo, 3 de setembro de 2017

Sem mudança de imagem

Embora ainda não esteja pedindo para as pessoas votarem no número 13, o ex-presidente da República petista já mergulhou de corpo e alma na campanha para voltar ao Planalto do Planalto, no próximo ano, à vista de sua caravana que se processa no Nordeste.
Como ainda não houve pedido de voto, ele deixa de ser enquadrado, para fins de punição, na legislação eleitoral, em que pesem os atos da citada caravana terem características de campanha eleitoral, jeito de campanha eleitoral e o retrato de campanha eleitoral e isso ninguém pode enganar.
O político, às vezes, desconversa para tirar o foco do assunto, quando afirma que “ainda falta muito tempo” para a eleição e “não existe candidato”, porém a forma da caravana tem tudo para dizer, sem subterfúgio, que as reais intenções são mesmo de campanha eleitoral antecipada, que é condenável pela legislação eleitoral.
Não há a menor dúvida de que se trata de viagem com a cara do disfarce, pintada do maior fingimento, para se dizer uma coisa, mas, na verdade, trata-se de outra, exatamente como se pretende, para se aquilatar a movimentação do povo com relação ao interesse do nordestino pelo o homem que se diz a cara, o corpo e a alma do povo daquela região.
Não se pode dizer em português claro que se trata realmente de campanha eleitoral, mas os comícios e os discursos não têm conotação senão de autêntica campanha política, porque a linha do que vem sendo dito não pode ser considerado de alguma forma senão de antecipação do pleito, inclusive com o comparecimento aos palanques de políticos comprometidos com as oligarquias regionais, aproveitando o ensejo para as juras de amizade eterna e inabalável.
Exemplo marcante disse foi o encontro do político com famoso senador alagoano do PMDB, onde foram declarados ardentes amores dos dois à política e gratidão recíproca, deixando às margens das conversas o fato de o senador ser réu no Supremo Tribunal Federal e ainda responder, pasmem, a 18 investigações na mesma Corte, sob suspeita da prática de corrupção, o que mostra o retrato fiel da desmoralização política tupiniquim, com a negação exatamente do que acontece nos países sérios, civilizados e evoluídos política e democraticamente de apego aos salutares princípios da dignidade, legalidade, moralidade, entre outros conceitos de idoneidade na vida pública.
O encontro entre os políticos serviu para criar mal-estar até mesmo no âmbito do PT, porquanto o senador alagoano até pode ter trabalhado no estrambótico fatiamento do julgamento que afastou do cargo a presidente petista, mas ele votou pelo impeachment dela, o que o fez “golpista”, na concepção dos petistas.
Em se tratando de conveniência política, não há dúvida de que há os golpistas que não são tão desprezíveis e que não possam ser compreendidos e até perdoados, nas palavras da presidente do partido, que declarou: “Não podemos levar essas coisas tão a ferro e fogo”.
Como a lição serve de exemplo, o político, que já foi condenado a nove anos e seis meses de prisão pelo juiz da Lava-Jato, no caso do tríplex do Guarujá, tem economizado críticas ao magistrado em seus discursos, mas isso faz parte da estratégia política às vésperas do novo depoimento do ex-presidente, agora com relação à compra de um terreno e de um apartamento com dinheiro de propina da empreiteira Odebrecht, já que as críticas abertas feitas por ele ao juiz, antes do depoimento de maio, não lhe renderam bons frutos.
Não obstante, a força-tarefa da Lava-Jato não tem sido poupada de críticas duríssimas, tendo sido responsabilizada pelo político até pela morte da ex-primeira-dama, quando ele disse: “Esses meninos da Operação Lava-Jato têm responsabilidade com a morte dela”, em que pese o político não ter tido o menor pudor de imputar à ex-esposa a responsabilidade pelas decisões envolvendo o citado imóvel.
Também não passa de escrachada tentativa de completa desmoralização o político se colocar à disposição para resolver não somente as crises que grassam no país, que tiveram origem nas gestões petistas, mas especialmente, pasmem, a crise criada pela Operação Lava-Jato, que, segundo afirmações de líderes sindicais, em transe de extrema loucura, o combate à corrupção prejudica a economia, por contribuir para aumentar o desemprego.
Não há dúvida de que o começo do governo petista foi exitoso, por ter aproveitado a estabilidade propiciada pelo Plano Real, deixado pelo governo tucano, ante a fidelidade ao tripé macroeconômico e às políticas de seu antecessor, que respaldaram o crescimento do país, que ainda teve a ajuda da forte demanda por commodities.
Não obstante, a implantação da “nova matriz econômica”, nos anos finais do governo do petista e na gestão da sua sucessora, o país entrou em total descontrole com a desenfreada e irresponsável gastança, ao sabor das fraudes fiscais que culminaram na maior recessão da história do país e nos quase 14 milhões de desempregados.
À luz dos acontecimentos altamente prejudiciais aos interesses nacionais, o político, principalmente por ser partícipe na ruína da economia e considerado o chefe da organização criminosa - no dizer dos procuradores da Lava-Jato - que destruiu a Petrobras, seria, em princípio, a pessoa menos indicada e confiável para assumir a tarefa de reconduzir o pais à trilha do tão sonhado desenvolvimento socioeconômico, ante a premência de mudança e até mesmo de revolução nas atividades político-administrativas.
O que não faltou na caravana foi discurso metendo o malho na imprensa livre, tendo o político prometido que “Se por acaso um dia eu voltar a ser presidente da República, certamente algumas coisas precisam acontecer”, fazendo referência ao que chamou de “jornalistas desonestos”, dando a entender que ele pensa, como meta de governo, endurecer com a imprensa, como se isso não tivesse o ranço da desgraça disseminada por governos ditatoriais, abcecados por colocação de ferrolhos na imprensa livre e independente.
Também houve exacerbado apelo às decantadas expressões “nós contra eles”, em que “a elite” não suporta o político, sob o argumento bisonho: “porque o pobre passou a ocupar aeroporto, frequentar shopping. Ele deixou de comer acém para comer filé, contrafilé; porque deixou de comer pescoço e pé para comer coxa, sobrecoxa e peito de frango. Os pobres começaram a comprar computador, laptop”, em verdadeiro contraste segundo o qual algum empresário, que integra a elite, fosse contrário às compras de seus produtos, fato que simplesmente demonstra verdadeiro contrassenso, por não corresponder exatamente ao sentido normal dos fatos.
Esperava-se que o político aproveitasse a sua caravana, com as características próprias de campanha eleitoral antecipada, para mostrar aos nordestinos outra imagem de homem público que tivesse aprendido bastante com as lições proferidas em razão dos levantamentos da Operação Lava-Jato, a mostrar comportamento muito mais condizente com a realidade dos fatos, principalmente que ele pudesse compreender que os integrantes da força-tarefa daquela operação têm o dever constitucional e legal de apurar os fatos denunciados no âmbito da sua jurisdição, cabendo a ele o direto da ampla defesa e do contraditório, com o devido amparo no ordenamento jurídico do país, como forma de contrapor às provas juntadas aos autos, com embargo das agressões, ameaças e outras não civilizadas medidas que não contribuem para o salutar desfecho das demandas judiciais. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 3 de setembro de 2017

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