O
ministro do Supremo Tribunal Federal que foi questionado pelo Ministério
Público de ser potencialmente suspeito de ter atuado, de forma indevida, em processo
do interesse de pessoa do seu círculo de amizade, informou à presidente da
corte que, ao contrário, não se considera suspeito para julgar casos relativos
ao empresário conhecido como o "rei
do ônibus", no Rio de Janeiro.
Logo
quando foi levantada a possível suspeição, o ministro teria se manifestado, de
forma irônica, por meio do "Poeminha
do Contra", da lavra de famoso poeta gaúcho, vazado nestes termos: "Todos esses que aí estão / Atravancando meu
caminho / Eles passarão/ Eu passarinho!".
O
Ministério Público pretende impedir que o mencionado ministro atue em casos
envolvendo o citado empresário, sob a alegação de haver relações pessoais entre
eles.
Investigado
na Operação Ponto Final, que apura esquema de corrupção no Rio de Janeiro, o “rei
do ônibus” foi preso, mas, logo em seguida, o ministro concedeu habeas corpus a ele e a outros oito
alvos.
Na
Justiça, na forma da Lei da Magistratura Nacional - Loman, há os casos de suspeição
- quando o juiz se considera inapto de atuar em caso por motivos subjetivos - e
o impedimento - por razão objetiva e definida por lei, como grau de parentesco
entre o juiz e o investigado.
O
então procurador-geral da República solicitou a nulidade das decisões adotadas
pelo aludido ministro, alegando que ele e sua mulher, que é advogada, possuem estreitos
laços com a família do criminoso, tendo citado o exemplo de que eles teriam
sido padrinhos de casamento da filha do empresário, em 2013.
Na
petição, há também a afirmação de que o escritório onde trabalha a esposa do ministro
defendeu interesses dos investigados na citada operação.
O
ministro tem negado que atuou como padrinho do casamento e afirma que apenas
acompanhou sua mulher na cerimônia, em razão de o noivo ser sobrinho dela.
Na
manifestação de defesa, o ministro afirma que foi sorteado, por acaso, como
relator do habeas corpus; a
presidente do Supremo decidiu que a Operação Calicute tinha conexão com a
Operação Ponto Final e que os processos de ambas fossem examinados sob a mesma
relatoria; que já decidiu em outros pedidos, mas que a PGR só pediu seu
impedimento naqueles em que ele concedeu o habeas
corpus; que "A utilização de
factoides para manchar reputações é uma infeliz prática em nosso processo
judicial", tendo concluído que “o
pedido é improcedente e sem base legal.”.
A
princípio, há três fatos que são passíveis de avaliação nesse imbróglio e precisam
ser sopesados, em relação à atuação do ministro, quais sejam: padrinho da filha
do empresário, o noivo é sobrinho da sua mulher e esta atua em escritório de
advocacia que defende o empresário, ou seja, são situações que exigem, no
mínimo, ponderação quanto à possibilidade de causar o impedimento dele para examinar
e decidir sobre o pedido da liberdade em causa, que até possa ter sido justa,
mas esse fato nem foi considerado, nas circunstâncias.
Enquanto
isso, agora, caberá à presidente do Supremo decidir se leva o pedido ao
plenário do Supremo, para que os ministros examinem e discutam a matéria,
podendo acolher ou não o pleito do Ministério Público, mas, de antemão, sabe-se
que são remotas as chances que eles votem pelo impedimento de seu colega,
embora os fatos mostram que a sensibilidade e o bom sendo jurídicos aconselham
que o ministro deveria ter evitado decidir em processo que poderia ter sido
trabalhado por outro ministro absolutamente alheio aos fatos questionados.
A
ministra-presidente também pode se convencer dos argumentos apresentados pelo
ministro, em sua defesa, e rejeitar o pedido da Procuradoria Geral da República
ou simplesmente nem o conhecer, em que pese a enorme repercussão negativa
causada diante dos fatos considerados de extrema suspeição, levando-se em conta
a relevância da função exercida por ministros da Excelsa Corte de Justiça do
país, que precisa se esmerar nos bons exemplos quanto ao seu desempenho na
magistratura.
Não
fosse o normal corporativismo que impera na administração pública – não se pode
afirmar que isso possa funcionar no Supremo Tribunal Federal -, esse caso, que
parece bastante emblemático, se traduz em excelente oportunidade para a
principal corte de Justiça do país mostrar os verdadeiros sentimentos de isenção,
imparcialidade e necessidade de se resgatar a credibilidade da instituição, em
forma de oferecimento à nação de um fio de esperança, principalmente no sentido
de que os ministros devam atuar estritamente em função dos princípios da
legalidade e da moralidade, com embargo de questionamento como do caso ora suscitado
pela Procuradoria Geral da República. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 28 de setembro de 2017
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