terça-feira, 9 de maio de 2017

À espera da prestação de contas

O partido que ainda se acha o mais ético do país tenta salvar o seu maior líder, como forma da própria sobrevivência, e, para tanto, a única forma possível será recolocá-lo no Palácio do Planalto, sob qualquer sacrifício.
Muitos simpatizantes ideológicos e algumas cabeças iluminadas da elite pensante estão se esforçando para encontrar fórmula mágica para possibilitar a volta dele ao poder, como forma de eliminar o que eles chamam de “perseguição odiosa e sem sentido algum” contra os líderes do partido, quase todos envolvidos em acusação da prática de irregulares com dinheiro público e alguns já presos, o que dá a verdadeira dimensão do nível da liderança partidária.
O plano de redenção da cúpula partidária é ambicioso, passando pela liberdade das velhas raposas, que se integrariam nos quadros que devem trabalhar para soerguer as estruturas esfarrapadas pelo bombardeio das graves acusações que pipocam em todos os lugares, minando cada vez mais suas bases.
          A ação que visa à recuperação do cacique-mor já começou a ser arquitetada e logo em breve irá ganhar os meios de comunicação, enchendo as ruas e os programas de marketing, tendo como carro-chefe “plano econômico”, que vem sendo trabalhado por especialistas de primeira linha e objetiva salvar o país da crise, que foi criada pelo próprio partido, mas, a seu modo de ser, isso faz parte de passado considerado, por ele, como já superado.
É pela via da reeleição que o homem mais honesto do planeta e “salvador da pátria”, perseguido e difamado por seus opositores, como assim ele é qualificado, quer encontrar o caminho da conquista do poder, fazendo uso das já surradas mandingas encrustadas em mentiras e distorções de fatos em favor de suas causas  e em abusos de chavões para tentar vitimar os aliados, além de pretender induzir a população a acreditar que as acusações contra o partido e integrantes não passam de invencionice, armação e injustiça articuladas para incriminar de morte a agremiação.
Há pouco tempo, participantes de movimentos sociais expediram manifesto de artistas e intelectuais defendendo o imediato lançamento da candidatura do político-mor à Presidência da República, que se convenceu do cabimento dessa medida, embora isso contraria o calendário eleitoral em mais de um ano, como se isso fosse normal.
A corrida desenfreada para se encontrar saída honrosa para o cacique visa livrá-lo da prisão, que se vislumbra inevitável, embora isso só evidencia que ele não é tão imaculado assim, porque, ao contrário, esse temor não era tão acentuado, mostrando um tanto de esdrúxulo, haja vista que a honestidade, a idoneidade, pressupõe nenhum temor de penalidade.
Mas o que se dizer, no caso de alguém já ser réu em cinco processos, acusado pelo Ministério Público Federal de comandar quadrilha criminosa, traficar influência, obstruir a Justiça, atentar contra o patrimônio público?
Mesmo assim, ele e seu grupo só pensam em agilizar a sua candidatura para tentar virar a página das denúncias e comandar, novamente, a República tupiniquim que seu partido conseguiu chafurdar e virar de ponta-cabeça, principalmente quanto à execução do sistema econômico e aos princípios da ética e da moralidade.
Imagine o panorama em que o personagem se autoproclama a alma mais pura do mundo – somente igualável a Jesus Cristo, nas suas palavras –, tenha a sorte da vitória nas urnas e depois seja, graças à morosidade do Judiciário, condenado em razão da série infindável de crimes pela prática dos atos irregulares cuja autoria que lhe seja atribuída?
É evidente que essa situação surreal aconselharia jamais se pensar em candidatura enquanto estiver vinculado aos horrores dos processos na Justiça, em que pesem boas chances de vitória eleitoral, que não seria nada agradável para o país e seu povo.
As pesadas acusações que estão sendo investigadas e as provas constantes das denúncias já seriam mais que suficientes para um cidadão comum ser preso, onde passaria a responder como réu, uma vez que presos da Lava-Jato já foram condenados por muito menos, exatamente porque não têm o prestígio de ex-mandatário do país.
Apesar de esculhambar o Judiciário, tentar desacreditar o juiz de Curitiba, usar e abusar de ardis para procrastinar a tramitação das ações, o político permanece serenamente na sua campanha ao Palácio do Planalto, tentando inflamar a militância com a propaganda de ser o verdadeiro salvador da pátria.
Nos países com um pouco de evolução, os crimes são julgados quase que imediatamente aos fatos, mas no país tupiniquim os processos se arrastam numa morosidade que muitos investigados ou réus até esquecem que são acusados de alguma irregularidade.
Já passou do tempo de as investigações contra os políticos passarem a merecer cuidados especiais, no sentido de que os fatos sejam resolvidos com a maior celeridade possível, de modo que as sentenças absolvitórias ou condenatórias sejam preferidas sem mais delongas, em benefício da sociedade e do país.
Embora o político tente encarar os fatos como se não fosse o principal personagem que se encontra no olho do furacão e que não houvesse nada de errado, capaz de obstaculizar sua vida política, há muita discordância sobre isso, inclusive intramuros do partido, pelo simples entendimento da existência dos laudatórios documentos, indícios e testemunhas contra o político.
Nos países sérios e com o mínimo de evolução, a Justiça é estruturada para funcionar em compatibilidade com indispensáveis presteza e celeridade, em atendimento aos anseios da sociedade, que precisa ter certeza de que os malfeitos, as irregularidades, as ilicitudes são chagas imperdoáveis que não podem continuar impunes, sob pena de os transgressores se julgarem desafiadores de tudo e todos e ainda de se passarem por pessoas mais honestas e mais puras, mesmo que os fatos apontem para outra direção.
Convém que a Justiça se esforce ao máximo para abreviar, com urgência, a sua inoperância tão prejudicial aos interesses nacionais, por permitir que pessoas, mesmas envolvidas em suspeitas da prática de corrupção, se achem no direito de ocupar o principal cargo do país, sem se atentarem que o ordenamento jurídica pátrio exige, mesmo que elas ainda não tenham sido condenadas, a comprovação de conduta ilibada, idoneidade e inexistência de qualquer espécie de suspeita sobre deslizes contra os princípios da ética, moralidade, dignidade, entre outros ínsitos das atividades políticas, que são necessárias a mostrarem o sentido da correção de conduta, sob pena de se desacreditar os consagrados princípios democrático e republicano.
Não há a menor dúvida de que a tentativa de antecipar o lançamento de candidatura a cargo público eletivo, quando o pleito propriamente dito ainda se distancia de mais de ano, é clara demonstração de atropelamento e burla aos princípios da ética, moralidade e dignidade, sobretudo quando existem fatos suspeitos de irregularidades, que exigem antecipadas justificativas e explicações, como forma de prestação de contas à sociedade sobre os atos praticados como homem público, que não pode se esquivar à sua responsabilidade de mostrar licitude quanto aos seus procedimentos na vida pública. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
       Brasília, em 9 de maio de 2017

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