segunda-feira, 8 de maio de 2017

Dúvida sobre imparcialidade

O procurador-geral da República enviou pedido ao Supremo Tribunal Federal para que o ministro que concedeu habeas corpus a um empresário preso pela Operação Lava-Jato deixe a relatoria do processo onde ele concedeu liberdade a ele.
O procurador-geral também pretende a anulação das decisões sobre o habeas corpus em causa, inclusive a que autorizou a soltura do empresário.
O empresário obteve liberdade no Supremo, após ter ficado preso por três meses, em razão da forte suspeita de ter pago gorda propina, em troca de contratos no estado, ao ex-governador do Rio de Janeiro, que se encontra preso.
O procurador-geral alega que a suspeita sobre o ministro se baseia no fato de que ele não poderia atuar na causa, porque sua esposa trabalha no escritório de advocacia que defende o empresário.
Ele sublinha que: “Em situações como essa há inequivocamente razões concretas, fundadas e legítimas para duvidar da imparcialidade do juiz, resultando da atuação indevida do julgador no caso. A situação evidencia o comprometimento da parcialidade do relator do habeas corpus (...) tendo ele incidido em hipótese de impedimento ou, no mínimo, de suspeição. Por tal motivo, suscita-se a presente arguição contra o ministro Gilmar Ferreira Mendes, a fim de se reconhecer a sua incompatibilidade para funcionar no processo em questão, bem como para que se declare a nulidade dos atos decisórios por ele praticados".
O procurador-geral fez referência ao Código de Processo Civil, onde há dispositivo que impede que a atuação do juiz em processo quando a parte for cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge.
Nesse contexto, a norma legal estabelece que o magistrado deve se afastar do caso, por suspeição se a parte for credora de seu cônjuge.
O procurador-geral afirmou que, "Com efeito, o julgamento por um magistrado de uma causa penal na qual figure como parte um cliente do escritório de advocacia do cônjuge do julgador ou um devedor de seu cônjuge, como previsto nos arts. 144, inciso VIII, e 145, inciso III, do Código de Processo Civil, contraria diretamente a exigência de imparcialidade, particularmente em seu aspecto objetivo".
Parece bastante configurada a situação que leva, de forma inexorável, ao entendimento de que o ministro estaria impedido de atuar no processo, diante da disposição insculpida no Código de Processo Civil, que não deixa dúvida alguma sobre isso, porque a sua esposa trabalha em escritório que cuida de interesses do empresário.
À toda evidência, ele precisa se esforçar muito para explicar para sociedade como é que um ministro da relevância do Supremo é capaz de ignorar regras básicas do ordenamento jurídico pátrio, quanto aos casos de suspeição, dando a entender que, nesse caso, ele teria agindo com deliberação, salvo se a sua decisão tivesse sido contrária aos interesses do empresário, o que não foi o caso.
É evidente que ainda é prematuro e não se pode fazer juízo de valor sobre a possível suspeita atuação do ministro, mas o bom senso e a razoabilidade aconselham que ele deveria ter mais cautela no sentido de não ter atuado no questionado processo, diante de fatos recheados de coincidências que não recomendariam a sua participação nesse caso, principalmente em se tratando que a decisão foi favorável ao postulante, o que conspira fortemente contra as possíveis isenção e imparcialidade do juiz.
É normal que o acusado sobre a prática de algo suspeito sempre procure se defender ou justificar seu ato, mas o ministro se mantém silente sobre o caso.
Convém que o Supremo Tribunal Federal tenha a sabedoria de descortinar o caso sob suspeita e mostrar à sociedade que a sua atuação, na pessoa do ministro acusado pelo procurador-geral da República, ocorreu absolutamente em harmonia com o regramento jurídico brasileiro, sob pena de desmoralização da mais alta corte de Justiça do país, de quem se espera exemplo de dignidade e de sabedoria, em prol do interesse público, notadamente por ser o órgão guardião dos princípios constitucionais. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 8 de maio de 2017

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