A
coligação do presidente da República ingressou com representação no Tribunal
Superior Eleitoral, pedindo a verificação extraordinária dos resultados da
eleição de 2022, sob a argumentação de que o suposto mau funcionamento de alguns
modelos de urnas eletrônicas, no segundo turno, deram equivocadamente a vitória
ao candidato adversário.
De acordo
com a representação da coligação do presidente derrotado, modelos anteriores ao
do ano 2020 das urnas eletrônicas teriam apresentado um problema no
funcionamento no chamado arquivos de log de sistemas.
Segundo a
petição, nas urnas que não estão consideradas normais, representando o universo
de 40,82% do total, o resultado apontaria vitória do presidente do país, com
51,05% dos votos válidos, enquanto o adversário dele teria 48,95%.
O
resultado oficial da eleição mostrou o contrário disso, com o candidato da oposição
com 50,90% dos votos válidos contra 49,10% do atual presidente.
No pleito,
foram utilizadas 472 mil urnas, no segundo turno, das quais 192 mil do modelo mais
recente e quase 280 mil de modelos fabricadas em anos anteriores, entre 2009 e
2015.
A coligação
do presidente do país defende a criação de comissão técnica independente de
verificação, formado por profissionais especializados, que não sejam vinculados
a partido político e à Justiça eleitoral, além da anulação dos votos apenas das
urnas questionadas, observadas as consequências práticas e jurídicas devidas,
com relação ao resultado do segundo turno das eleições de 2022, ante a
existência de "indício muito forte" de que há problema nas
urnas, a par da violação do sigilo do voto no caso de urnas que foram
desligadas e religadas.
A coligação
também alega que as inconsistências não permitem se atestar o resultado ou que
as urnas não registraram o resultado eleitoral, embora "Isso não quer
dizer que ocorreu uma fraude, mas é uma possibilidade, não se tem certeza de
que aquelas urnas tenham credibilidade suficiente para atestar aquela votação".
Na
concepção de um matemático, consultor em eleições digitais e um dos criadores
da urna eletrônica brasileira, o arquivo de log, apontado como problema pela
auditoria da mencionada coligação, "não tem nada a ver com o núcleo do
ecossistema da urna eletrônica. Ele não interfere absolutamente em nada no que
diz respeito ao recebimento do voto, ao registro do voto ou à apuração dos
resultados".
Enfim,
o resultado final da votação não pode ter dúvida de ninguém, muito menos do
eleitor, sobre a sua fidelidade à vontade popular.
O
relatório técnico em comento evidencia, em princípio, de forma consistente, a
existência de sérios e concretos problemas inerentes à vulnerabilidade no
sistema eletrônico da votação, que a Justiça eleitoral vem garantindo perante a
sociedade e o mundo que se trata de algo perfeito, sem qualquer mácula, quanto
à segurança e confiabilidade, na forma prevista na legislação de regência, em
termos da pretendida segurança jurídica.
A verdade
é que a fiscalização que se impõe precisa ser realizada sempre que tiverem indícios
sobre quaisquer suspeitas de irregularidades, não importando quais sejam, porque
isso faz parte do processo democrático, que não permite a existência de dúvida
de maneira alguma na administração pública, que se refere à incumbência da Justiça
eleitoral ser transparente nas atividades sob a sua responsabilidade, em
especial no que se refere ao processo eleitoral, como salvaguarda natural das premissas
democráticas.
O
relatório em apreço se baseia no glossário das eleições informatizadas de
2022, que descreve as funções dos três arquivos gerados pelas urnas
e publicados no portal do Tribunal eleitoral, a exemplo do boletim de urna -
que permite conhecer o resultado em cada sessão eleitoral, assim como a
realização de testes dos equipamentos pertinentes; o RDV - registro
digital do voto, que permite eventual recontagem do arquivo que registra todos
os votos; e log da urna, que o elemento importante de auditoria para os
partidos políticos e entidades fiscalizadoras, que serve como espécie de diário
onde cada linha registra a atividade da urna, cujas informações têm a finalidade
de garantir a associação com o hardware e a segurança do processo eleitoral.
Com base nesses elementos e equipamentos,
as análises realizadas em cerca de 472 mil urnas permitiram se encontrar dois
comportamentos diferentes de acordo com o modelo das urnas, em que, em 192 mil
urnas do modelo novo, a partir de 2020, o comportamento é o esperado, seguindo
a normalidade processual, enquanto em mais de 279 mil urnas, com fabricação anterior
a 2020, ou seja, 59,2% do total, foi constatado, em cada linha de funcionamento
delas, o código é inválido, impedindo a associação à urna, o que indica claro indício
de evidência de mau funcionamento da urna, diante do desvio de padronização de
qualidade, se comparado com as urnas fabricadas a partir de 2020.
Em
princípio, o relatório em apreço mostra importante desvio de funcionamento das
urnas, quando vários aparelhos travaram, deixando de funcionar, tendo sido desligadas
no processo da votação e posteriormente religadas, cujo procedimento caracteriza
violação do sigilo do ato da votação, por expor dados pessoais do eleitor, ou
seja, houve interferência no sigilo da votação.
O
relatório mostra que, com o uso das urnas fabricadas anteriormente a 2020, nas quais
foram apontados mau funcionamento, há comprometimento do resultado final e da
sua credibilidade, à vista da constatação de erros recorrentes, em que o
candidato declarado vencedor teria atingido 52% dos votos, contra 47% do
candidato derrotado.
Por sua
vez, com base nas urnas fabricadas a partir de 2020, que apresentaram
funcionamento normal, o candidato derrotado ganha com mais 51% de votos contra
48,95 % para o seu adversário, ou seja, os resultados são discrepantes
para modelos diferentes das urnas, conforme consta do relatório protocolado
no Tribunal eleitoral.
De acordo
o citado relatório, há a constatação de inconsistências gritantes e recorrentes
em todas as urnas fabricadas anteriormente a 2020, que não permitem atestar o
resultado eleitoral ou a vontade do eleitor e compromete a segurança e a credibilidade
do processo eleitoral.
Diante
das referidas discrepância e inconsistências, urge que a Justiça eleitoral
adote as necessárias providências legais, de modo que justifique e esclareça,
na forma da lei, as medidas imprescindíveis ao saneamento desses desvios procedimentais,
eis que, se existem indícios de dúvidas, quanto às queixas de mau funcionamento
da votação, isso implica que, de forma indevida e irregular, um candidato foi atestado.
Em que
pesem todas as argumentações sobre possíveis inconsistências e outros questionamentos
sobre o resultado da votação, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral indeferiu
o pedido em apreço, explicando que o arquivo com voto é algo diferente do log,
que foi questionado pela coligação, e ainda aplicou multa milionária aos autores
do pleito, por litigância de má-fé.
Causa
perplexidade que, em tão pouco tempo, sem a devida análise técnica e decidindo
pelo plenário do Tribunal eleitoral, o presidente resolva sozinho a questão que
merece as devidas explicações, uma vez que as dúvidas permanecem quanto à legitimidade
do resultado das urnas, à luz dos fatos suscitados nas argumentações em causa.
No Estado
Democrático de Direito, a decisão em apreço não condiz com a transparência que
se espera da administração pública, que diz com a exposição detalhada dos
procedimentos adotados com relação à apuração dos votos, em especial, a partir
da disponibilização do código fonte, para facilitar o trabalho de quem quiser
fiscalizar a regularidade dos procedimentos adotados pela Justiça eleitoral,
com a devida minúcia, a operacionalização da votação.
Enfim, resta
se conformar com a situação, tendo em vista que foi o povo que quis assim,
votando no candidato que prometia, pasmem, democracia, quando a confirmação dos
resultados das urnas é decidida exclusivamente ao livre-arbítrio por quem tomou
partido pelo candidato eleito e não se dispõe a agir com a devida
transparência, fato que evidencia total falta de respeito aos princípios democráticos.
Brasília,
em 24 de novembro de 2022
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