Em
mensagem que circula nas redes sociais, alguém escreveu que “O Presidente
Jair Messias Bolsonaro é o atual chefe e líder maior das Forças Armadas, (...).
A Constituição garante no seu artigo primeiro que o povo é o poder maior na
democracia e a ele devem obediência aos seus representantes. Então vamos dar a
ordem para o chefe das Forças Armadas, aquele que jurou defender a nossa
liberdade com a própria vida, a saber, ao nosso Excelentíssimo Presidente da
República, Sr. Jair Messias Bolsonaro. Vamos todos ordenar já, em uníssono, bom
e alto tom! Sr. Presidente o povo ordena que o Senhor cumpra sua obrigação! Ordene
às Forças Armadas para entrarem em ação! Sr. Presidente obedeça ao povo e a
constituição! Dê logo o comando às Forças Armadas, para libertar nossa Nação! Sr.
Presidente convoque o STM e cumpra sua missão! Honre O NOSSO DEUS, as Famílias
e a Nação! (...)”.
De logo, percebe-se
que está escrito na mensagem supratranscrita que o povo é o poder maior, na
democracia, à luz do disposto no artigo 1º da Constituição e, por isso, os
representantes políticos devem obediência ao povo, razão do desejo colocado na
mensagem de se ordenar que autoridades da República ouça o povo e cumpram as
suas ordens.
Ao contrário
dessa compreensão, ocorre que não é exatamente essa a interpretação dada ao
parágrafo único do aludido dispositivo, que apenas estabelece, verbis: “Art.
1º (...) Parágrafo único. Todo poder emana do povo, que o exerce
por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta
Constituição.”.
Na
verdade, o que diz o texto e sobre isso se pode inferir clara e tranquilamente
é que o povo tem o poder sim, que o transfere para os seus representantes
políticos, por meio do voto, ou seja, o poder que é do povo deixa de ser dele
quando ele elege o seu delegado, por meio do voto, tamanha a sutileza da norma constitucional
que confunde os menos instruídos quanto à sua literalidade interpretativa.
Daí a
expressão “Todo poder emana do povo, ...” e somente isso, que já é
muito, mas sem nada mais, porque só existe poder formalmente se tiver o voto do
povo, no caso, se ele eleger quem possa exercer, de forma efetiva, o poder, que,
no caso, são os representantes legalmente eleitos.
No mais, o
povo não tem poder para absolutamente nada e muito menos para exigir ou ordenar
alguma medida de ninguém, nem do presidente do país e muito menos dos demais representantes
políticos, que recebem o mandato de mão beijada, sem compromisso de coisa
alguma, nem mesmo de defender as causas do povo, que já seria o mínimo, em se
tratando de regime democrático, em que, em princípio, o povo deveria ter o
controle do poder, inclusive com o dever constitucional de seguir a vontade
dele, caso essa regra básica estivesse claramente definida na Lei Maior do
Brasil.
O certo é
que o povo, embora seja a célula máter da nação, ele somente tem o direito ou o
dever de formalizar e constituir o poder, para ser exercido por seus
representantes políticos, nos termos do parágrafo único supratranscrito e mais
nada, porque nenhum poder ao povo foi consignado na Constituição, senão,
repita-se, o dever de votar nesses representantes.
Na
verdade, essa desagradável situação, que mostra visível descompasso com a evolução
da humanidade, tem o condão de confirmar o desinteresse ou a involução do povo,
que aceita pacificamente tal realidade, na forma exatamente definida por seus representantes,
que aprovaram a Constituição e estabeleceram apenas o dever da votação para elegê-los,
deixando de definir formas e meios capazes de se permitir a participação do
povo nas decisões nacionais, a exemplo da aceitação da imposição dos anseios do
povo, para ele realmente ter voz e ainda puder ser ouvido, precisamente em
harmonia com os princípios republicano e democrático.
Diante
dessa terrível e desagradável notícia, convém que a Constituição seja
atualizada, com vistas à inserção de dispositivo que possibilite amparar não só
o dever de o povo eleger seus representantes políticos, mas também, em
especial, de puder influenciar e até interferir em assuntos relevantes e de
interesse nacional, como acontece no presente momento, em que as autoridades
dos poderes Executivo e Legislativo seriam obrigadas a ouvir o povo, para o fim
de promoverem as medidas necessárias ao combate à terrível crise que se abateu
sobre os poderes da República.
Além
disso, é interessante que se permita que também haja a possibilidade de recall
político, para o fim de puder se avaliar sobre a conveniência do afastamento do
cargo para o qual o representante político foi eleito, sempre que ele se
evolver em caso de negligência funcional, a exemplo de deixar de cumprir as
promessas de campanha, ou em irregularidades.
A verdade
é que o povo, embora seja tudo perante o Estado, porque sem ele este sequer
existe, mas, perante a Constituição brasileira, o povo não é absolutamente nada
com relação ao ordenamento da sua vontade diante dos seus representantes,
ressalvado, obviamente, o seu poder de eleger os dirigentes dos poderes
Executivo e Legislativa, que também deveria ter o poder de eleger os membros do
Judiciário.
Não
há a menor dúvida de que o povo é a razão da existência do Estado, mas nada
disso tem importância se não houver definição bem clara, na Constituição, mediante
o estabelecimento, em termos políticos, sobre os seus direitos, inclusive
quanto ao poder de dizer o que os seus representantes políticos devam fazer, em
sintonia com a sua vontade, em especial, no sentido de serem obrigados a ouvir e
obedecer ao povo, quanto aos seus anseios sociais, em harmonia com os
princípios democráticos.
Brasília,
em 28 de novembro de 2022
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