terça-feira, 28 de junho de 2016

Caos generalizado


O Tribunal de Contas da União examinou a qualidade do atendimento em mais de uma centena de hospitais públicos, os mais procurados pela população em todo o país, tendo concluído que se trata de situação simplesmente assustadora, principalmente quanto à forma de tratamento de total desprezo ao doente, em todas as unidades visitadas.
Houve a constatação de que a saúde pública brasileira insiste em tratar os pacientes em meio à falta de quase tudo na rede pública e à generalizada desorganização.
A situação dos Prontos Socorros dos hospitais é sempre abarrotada de doentes que exigem atendimento emergencial, mas o reduzido quadro de pessoal médico e de saúde e o acumulo de casos não permitem evasão normal e de forma satisfatória.
Todos os hospitais se encontram em completo estado de penúria para o atendimento dos pacientes quando ainda conseguem internação, onde há falta de medicamentos e de materiais necessários ao devido tratamento.
Muitos pacientes conseguem na Justiça decisão liminar determinando que o hospital realize a operação ou o tratamento, mas em nada altera a situação de incapacidade de atendimento dos doentes, justamente devido à falta de recursos humanos e matérias, que não são repostos à altura da demanda, que cresce exatamente em proporção inversa aos cuidados da competência do Estado, que cada vez se distancia da realidade e da precariedade dos hospitais sucateados e descuidados por parte dos governos federal e estaduais.
Já é prática normal em todos os estados a tentativa de o paciente recorrer à Justiça - que passa a cuidar cada vez mais de assuntos que não precisavam da sua atuação – para conseguir tratamentos por força de liminares, mas nem todos são atendidos, mesmo com decisão judicial na mão, reconhecendo a extrema gravidade da situação, em que o risco de vida é iminente.
É lamentável o caso narrado por uma pessoa, filha de uma doente grave, nestes termos: “Essa liminar foi dada dia 22 que o juiz determinou fazer a cirurgia, de abril. Está até aqui, está citando que o Estado tá pagando R$ 20 mil de multa ao dia e não foi cumprido a liminar, e a minha mãe está nessa situação”, ou seja, nem adianta ter a determinação judicial, porque o hospital não tem como cumpri-la, caso em que a doença tende a se agravar. 
O certo é que se tornou comum o abarrotamento de doentes nos hospitais, nas emergências e nas unidades de saúde, a qualquer hora do dia, inclusive nos melhores centros de saúde do país, como o Distrito Federal, que tem o maior número de médicos por habitantes.
São simplesmente aterrorizadores e assustadores alguns casos relatados por pessoas e médicos, como a de um médico que preferiu não se identificar, porque a sua revelação diz que a UTI do maior hospital de uma capital onde ele trabalha chega a funcionar sem médicos. Ele disse que “São vários plantões em que não há médico na UTI. É como estar num avião sem piloto”.
O Tribunal de Contas da União constatou que, na maioria dos estados, há menos leitos do que seria necessário e a situação somente tende a piorar, porque a rede pública de saúde perdeu, em pouco tempo, mais de 12 mil leitos, representando, em média, doze leitos fechados por dia, ou um a cada duas horas! Além da interdição de 2.389 leitos, por força da falta de profissionais e equipamentos.
Um médico relatou que, em determinado local, não tem dois leitos simplesmente porque não tem funcionário, não tem cabo, não tem monitor, só tem o espaço físico, mas não tem o leito em si de UTI, ou seja, falta o técnico de enfermagem suficiente para tomar conta.
O TCU constatou que, em 85% dos hospitais visitados, os administradores disseram que a estrutura física das unidades não era adequada, e, em 77%, dos hospitais falta algum tipo de equipamento, sendo que, em 23%, eles não foram instalados e muitas vezes ficam encaixotados no corredor, como em um hospital em Feira de Santana, na Bahia. O tomógrafo, usado para examinar o cérebro, não funciona, ou seja, o aparelho novo havia chegado, mas está em uma caixa, no canto de um corredor.
Outra situação dramática e a falta de remédios na rede pública brasileira, onde quase 80% dos hospitais não há atendimentos por falta de medicamentos ou materiais básicos como seringas e esparadrapo, simplesmente porque a maioria absoluta dos administradores aponta falhas no processo de compra como o motivo mais comum.
O Conselho Federal de Medicina diz que para salvar os pacientes, o principal é melhorar muito a administração da saúde pública: “Mais saúde depende de maior financiamento, melhor gestão administrativa, mais capacitados médicos e um bom sistema nacional de controle e avaliação. Infelizmente, a vontade política ainda não foi suficiente para a implementação desses parâmetros fundamentais à mais saúde”.
O Ministério da Saúde disse que “O principal fator de redução do número de leitos no Brasil é a mudança do modo de atendimento das pessoas. É uma tendência mundial que cada vez mais seja o ambulatório e, não o hospital, o principal ponto de atendimento das pessoas. Reconhecendo que alguns hospitais têm situações muito críticas, principalmente os grandes hospitais de urgência, ele tem desenvolvido um programa específico que hoje já chegou a 28 hospitais do país, que é o SOS Emergência. A nossa expectativa é que nós possamos construir um sistema público, cada vez de melhor qualidade, com a melhor capacidade de resposta para o conjunto da população”.
O TCU constatou que a falta de médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem é um problema crônico, tendo verificado que, em 81% dos hospitais visitados, os administradores reconheceram que há menos profissionais do que seria necessário para atender a todos os pacientes que procuram atendimento.
Ou seja, trata-se de verdadeiro desprezo à saúde dos brasileiros, quando os hospitais, além da escassez de materiais, equipamentos e medicamentos, dispõem de tão somente 19% da sua força de trabalho para atender à população, fato que se traduz na tragédia exposta à luz solar, que se encontra materializada na saúde pública, a demonstrar, de forma cristaliza, total desrespeito à dignidade do ser humano, que deixa de receber tratamento de qualidade justamente pela visível incompetência dos administradores públicos, que deixam de priorizar, como é do seu dever constitucional e legal, o que mais sagrado existe na face da terra, que é exatamente a vida humana.
Há a expectativa de que a mudança de governo possa atrair para o centro das decisões nacionais maior interesse na priorização das questões relacionadas com a saúde dos brasileiros, uma vez que o caos no atendimento de 150 milhões de pessoas que dependem exclusivamente do Sistema Único de Saúde exige cuidados especiais para a saúde pública, de modo a merecer a prioritária atenção das autoridades incumbidas dessa tão importante matéria, que é a saúde da população, tão carente de solução emergencial. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
       Brasília, em 28 de junho de 2016 

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