quarta-feira, 10 de março de 2021

A inconsciência do voto

 

De acordo com pesquisa realizada pelo Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria), o ex-presidente da República petista supera, no momento, o atual ocupante do Palácio do Planalto, em potencial de voto para a eleição de 2022, em termos de opinião que mede o capital político de dez possíveis candidatos.

O aludido levantamento, que foi divulgado pelo jornal O Estado de S. Paulo, mostra que 50% dos entrevistados disseram que votariam com certeza ou poderiam votar no petista, caso ele se candidate à Presidência, e 44% afirmaram que não o escolheriam de jeito nenhum.

A pesquisa mostra que o segundo colocado foi o atual presidente do país, que aparece com 38 pontos porcentuais no potencial de voto e 56% no quesito rejeição, no sentido de que não se votaria nele de jeito nenhum.

Na sequência desses nomes, vêm o ex-juiz da Operação Lava-Jato, com 31%, um apresentador global, com 28%, o candidato petista derrotado na última eleição, 27%, um cacique político do Ceará, com 25%, uma ex-seringueira, com 21%, um ex-ministro da Saúde, com 15%, o governador de São Paulo, com 15% e o candidato do Psol à prefeitura de São Paulo, na última eleição, com 10%.

Com exceção do ex-juiz, cuja taxa de rejeição é de 50%, os demais nomes citados na pesquisa foram descartados como opção de voto pela maioria do eleitorado.

Empatados tecnicamente com os 56% do atual presidente, no quesito “não votaria de jeito nenhum”, estão a ex-seringueira, com 59%, o apresentador de TV, com 57%, o governador de São Paulo, com 57%, o cacique do Ceará, com 53%, e o ex-candidato petista, com 52%, ou seja, todos com índice de rejeição superior a 50%.

A pesquisa do Ipec também mostra em quais segmentos do eleitorado os candidatos têm mais apoio, como no caso do atual presidente, que conta com a simpatia de 53% de evangélicos, de 46% de moradores da região Sul e 45% de pessoas da faixa de renda entre dois e cinco salários-mínimos.

Nesse modelo de pesquisa, foi esclarecido que, em vez de se apresentar lista de candidatos e pedir ao entrevistado que aponte seu preferido, o instituto cita o nome de cada possível concorrente e pergunta se o eleitor votaria nele com certeza, se poderia votar, se não votaria de jeito nenhum ou se não o conhece suficientemente para responder.

A soma das duas primeiras respostas – “votaria com certeza” e “poderia votar” – é o potencial de votos.

A propósito da pesquisa de potencialidade, ressalte-se que o líder petista acaba de adquirir condições de elegibilidade, por ter sido liberado de suas condenações penais, pelo Supremo Tribunal Federal, podendo se candidatar à Presidência da República, no próximo pleito eleitoral.

Diferentemente das pesquisas de intenção de voto, a de potencial tem por finalidade a medição sobre o piso e o teto de aceitação dos candidatos que estão mais em evidência, embora seja possível se presumir que, à vista do reduzidíssimo público auscultado, nos dias 19 e 23 de fevereiro, tão somente de 2.002 pessoas, entre mais de 150 milhões de eleitores, e em apenas 143 municípios, entre mais de 5.570 existentes no país, conforme informado pelo Ipec, essa pesquisa não pode ser absolutamente confiável, para conclusões tão importantes sobre o futuro político do Brasil.

Isso serve para mostrar  enorme disparate, em termos de consistência de avaliação eleitoral, em razão das suas pouquíssimas abrangência e precisão da amostra em relação ao universo, como visto acima, tanto em relação à quantidade de pessoas consultadas como à redução dos municípios, além de não terem sido indicadas as regiões nem a participação dos ouvidos em cada uma delas, porque isso tem bastante influência no cômputo geral, diante da tendência dos eleitores, o que significa dizer que não se trata de pesquisa com total credibilidade, para a finalidade tão importante como a da tendência dos eleitores brasileiros.

Ressalte-se que o petista, potencial candidato à Presidência, agora livre legalmente para se candidatar a cargo público eletivo, se livrou das garras da Lei da Ficha Limpa, diante da anulação das condenações penais proferidas por órgão colegiado, a quase 30 anos de prisão, pela prática dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, precisamente por ele não ter conseguido provar a sua inculpabilidade sobre os fatos denunciados à Justiça, em que pese ele se considerar inocente e o político mais limpo do planeta.

Como não conseguiram provar a inocência do político, o Supremo arranjou jeitinho brasileiro para anular as sentenças condenatórias do político, não por meio de elementos probantes inerentes à inculpabilidade, mas sim sob a alegação da incompetência de julgar do tribunal a quem se subordinava a Operação Lava-Jato, pondo por terra todo trabalho realizado, com muitos e imensuráveis esforços e custos materiais, humanos e financeiros, além dos prejuízos para o erário, que vai deixar de receber de volta os valores referentes ao que foi desviado e às multas já aplicadas, na forma da lei.

De qualquer modo, tem-se a certeza da firme e consistente materialidade da autoria dos crimes denunciados à Justiça, conforme as robustas provas constantes dos autos pertinentes, que ofereceram fundamento jurídico para as condenações anuladas, não por meio de contraprovas, de que o político teria se beneficiado de recursos ilícitos, cujos atos caracterizam crimes capitulados no Código Penal Brasileiro e que ainda poderão ser objeto de julgamento pela Justiça, porque sobre o ilícitos em apreço os brasileiros honrados e dignos já se pronunciaram, em alto e bom som, em veemente repúdio à conduta incompatível com os princípios da moralidade na administração pública.

Isso vale dizer que a anulação das condenações, por se tratar de procedimentos sem qualquer repercussão ou vinculação com os atos irregulares praticados pelo político, não modifica absolutamente nada o entendimento consagrado da prática delituosa pelo recebimento de propina, fato este que também em nada altera o entendimento segundo o qual o enquadramento da conduta ilibada do homem público tem como pressuposto a sua lisura na prática de seus atos na vida pública, o que não é o caso do petista, que até pode se beneficiar da anulação das condenações já colacionadas, eis que ela ainda pende de confirmação acerca de recurso a  ser impetrado pela Procuradoria Geral da República, mas o que importa é que permanecem intactas as denúncias sobre as práticas de ilicitudes, que hão de ser rejulgadas, pelos mesmos crimes, porque as ações penais continuam plenamente vivas e valendo, diante da Justiça.

Isso significa que, sem o afastamento definitivo das acusações sobre a prática de atos irregulares, na gestão pública, que é efetivamente o caso em comento, o homem público não reúne condições ética e moral para exercer cargo público eletivo, segundo os princípios republicanos da legalidade e da dignidade, que exigem que o representante do povo tenha a ficha pregressa pessoal absolutamente limpa, imaculada, sem qualquer suspeita sobre a prática de improbidade administrativa, o que não é o caso do político, que não conseguiu provar a sua inocência, na Justiça, à vista das denúncias de fatos irregulares cuja autoria é atribuída a ele.  

É preciso que os brasileiros tenham a verdadeira conscientização sobre o fato de o político ter sim o direito de se considerar inocente, não aceitando a realidade sobre o que acontece com ele, e os fatos denunciados, um vez que a pessoa age exclusivamente em defesa da sua razão, por considerar que os casos inquinados de irregulares são, sob a sua ótica, absolutamente inexpressivos e incapazes de atingir ou macular a sua honra de homem público, em termos de capacidade para a caracterização daquilo que se atribui à autoria dele, como a se dizer que a sua autoridade é tão infinita que tentam em vão a imputação de culpa por ato sem a menor importância, evidentemente sob a exclusiva ótica pessoal, o que é bastante diferente da visão das demais pessoas, no que se refere, em especial, ao quesito princípio da moralidade.

É evidente que o político ou qualquer pessoa tem o direito de defender a exata visão sobre a sua realidade, a sua verdade, quanto aos fatos da vida, como no caso em apreço, em que ele se considera inocente por fatos inaceitáveis moralmente por outras pessoas, por menor que eles sejam.

A verdade é que, na vida pública, qualquer deslize é realmente motivo de censura e recriminação, diante da obrigação da linearidade do cumprimento dos princípios da legalidade e da moralidade, que são regras de conduta inafastáveis, não importando a relevância nem a influência políticas das pessoas públicas.

A propósito, ressalte-se que as questões ética e moral são tão importantes nas nações sérias, civilizadas e evoluídas, em termos político e democrático, que os homens públicos acusados do desvio legal ou ético, ou seja, da prática de ato contrário à legalidade e à moralidade, se afastam automaticamente das suas atividades, para cuidar da sua defesa e tentar provar a sua inocência, apenas voltando a assumir as suas funções, a depender da situação, depois de solucionar as pendências envolvendo a reputação do seu nome.

O corolário disso é que os políticos sem mandato são impedidos, sob o prisma da moralidade pública, de participar de pleitos eleitorais, enquanto estiverem com o seu nome envolvido com suspeita da prática de irregularidade.

Ou seja, somente os cidadãos com a ficha limpa, independentemente de julgamento pela Justiça, podem exercer cargos públicos eletivos, enquanto no país tupiniquim, mesmo condenado pela prática de ato delituoso, desde que não tenha sido julgado por órgão colegiado da Justiça, o homem público tem plenos direitos de representar o povo, fato este que indica que o Brasil precisa urgentemente evoluir e se tornar país com o mínimo de civilidade, em termos políticos.

No Brasil, o homem público, mesmo acusado da prática de irregularidade e sem conseguir provar a sua inocência, jamais se afasta voluntariamente do cargo e da vida pública e ainda se empenha ao máximo para se eleger a cargo público, às vezes o mais relevante do país, na certeza da conquista da impunidade, sob a blindagem do mandato, como se este fosse a real garantia da incolumidade, que apenas tem o condão de materializar a banalização da esculhambação na administração pública.

Essa prática vergonhosa, imoral e indigna de degeneração dos bons costumes e das condutas civilizadas vem acontecendo porque ninguém se elege se não tiver o efetivo apoio do povo, do eleitor que normalmente vota, sem os menores cuidados e escrúpulos, em homens públicos mesmo que eles não reúnam as necessárias condições do preenchimento do requisito da conduta moral exemplar, quando, mesmo acusados der desvio ético, preferem se autoconsiderar inocentes, em razão da abissal dificuldade de provar a sua inculpabilidade quanto aos fatos cuja autoria é atribuída a eles, a exemplo do caso em referência.

É evidente que o eleitor tem não competência legal para julgar o comportamento ou desempenho dos homens públicos senão por meio do voto e por meio desse poderoso instrumento ele pode perfeitamente dizer que somente merece o seu voto o candidato que estiver com a ficha limpa, evidentemente depois de provar a sua inocência nas vias competentes, estritamente em condições sine qua non, ou seja, mesmo que o candidato seja inocente, é preciso que isso seja declarado, quando for o caso, por quem de direito, que normalmente é a Justiça.

Enfim, caso os brasileiros tivessem algum interesse pela moralização da administração pública, jamais elegeriam candidatos que não apresentassem, entre outros tantos requisitos de competência, sensibilidade humana, interesse pela causa pública, quanto aos princípios da legalidade, moralidade, eficiência, economicidade etc., a ficha pregressa limpa, porque esse documento condiz exatamente com os princípios da valorização da dignidade político-administrativa, que são defendidos com muito ardor pelas nações evoluídas e civilizadas, para o próprio bem do seu povo.           

Brasília, em 10 de março de 2021

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