segunda-feira, 22 de março de 2021

A dor do coronavírus

 

Nos mais tenebrosos momentos da história, os bons exemplos da população são no sentido de que, diante das piores tragédias, é preciso que prevaleçam a ordem, a compreensão e a solidariedade com relação, em especial, perante a quem mais precisa de ajuda, conforto e amor cristãos, como importante contribuição à superação e à reconstrução da vida.

Pensar diferentemente disso, certamente é a pior maneira de lidar com as dificuldades, porque a ideia de cada um por si e Deus por todos só demonstra falta de sentimentos e princípios humanitários diante de situação que precisa de urgente saneamento, para que a vida volte à normalidade.

Na realidade, o sentimento prevalente atualmente no Brasil é o de que os princípios da  cooperação e da solidariedade estão adormecidos em algum lugar bem distante, porquanto tem sido mais simpatizada a ideia do pânico e do pior melhor para harmonizar-se com planos políticos, geralmente alardeado por autoridades públicas, possivelmente visando lucrar sobre a tragédia que invade contra o povo, diante do inafastável pressuposto de que não há mal que não possa piorar, quando a população se torna fora de controle.

Diante desse quadro de descontrole social, homens públicos possuídos pelo poder costumam apelar para a força bruta, com a finalidade de se evitar mal maior, diante de cenário que somente existe na mentalidade deles e isso pode resultar em consequências desastrosas para a nação e seu povo.

O Brasil vive o pesadelo da pandemia do novo coronavírus há mais de ano, que se transformou na noite dos bombardeios sob as cabeças da população, sob intensos e incessantes ataques, sem tempo para se avaliar a nossa verdadeira capacidade de juntar os destroços e reconstruir o que ainda resta de competência, inteligência e humanidade, ante a enorme incapacidade de diálogo, consenso e compreensão sobre a real dimensão dos estragos causados pela Covid-19.

Na realidade, as terríveis bombas em forma de Covid-19 se potencializam há mais de um ano e já conseguiram causar rombo humano de quase 300 mil mortes, ante a enorme dificuldade para se compreender que falta seriedade para combatê-la com a maior intensidade possível, quando se sabe que se trata de vírus que sofreu mutações e se tornou ainda mais contagioso e letal.

É sabido que a variante, que teve início em Manaus, parece se apresentar fora de controle, principalmente com a tentativa de boicote às importantes e necessárias medidas de isolamento para se conter a sua propagação país adentro.

A situação se torna mais ainda mais grave quando, diante da tragédia, há insensatas ideias em forma de fingimento de que ela inexiste, mesmo que seus estragos sejam terrivelmente visíveis e inevitáveis.

Os fatos mostram que os alertas sobre a gravidade da crise foram simplesmente ignorados, permitindo que as variantes se fortaleçam e avancem sobre multidões incautas e ingênuas, alimentam as mesmas ideias contrárias ao isolamento, ante a inexistência suficiente de vacinas.

A verdade é que, a doença que somente ameaçava, segundo o especialista palaciano, idosos, pessoas com deficiência ou comorbidades, já dizimou multidão de brasileiros produtivas e com histórico de muitas mortes, agora também já avança sobre crianças e jovens, que temem pelo seu futuro com a falta de perspectiva sobre as aulas presenciais, que podem contribuir para a propagação de infecção dos pais e responsáveis.

No momento, há forte evidência de que a condução errática da crise causada pela pandemia permitiu aglomerações e a consequência foi a natural e inevitável superlotação nos hospitais de doentes da Covid-19, onde as pessoas morrem à espera de atendimento, diante da carência de recursos materiais e humanos para o pronto atendimento, com a necessária presteza, que tem sido inexistente, exatamente diante do sobrecarregamento dos profissionais de saúde, que já trabalham muito além do seu limite e da capacidade humana.

          O cenário se torna ainda mais fúnebre diante da aposta pesada, que surge do comando da crise, segundo a qual há evidência de pânico iminente, com mais mortes e o surgimento de fome, se houver a insistência da implantação, por muito tempo, do isolamento social, quando, logo em breve, vai surgir o pior dos mundos, com automortes, saques generalizados, violência na família, entre outros transtornos sociais graves.

Esse parece o cenário ideal para servir de pretexto perfeito para candidatos a regimes ditatoriais, quando  antes deveriam ser insensíveis e prestar solidariedade aos familiares dos brasileiros que já perderam a vida, nessa lamentável situação de muita omissão, incompetência e falta de interesse para se enxergar a verdadeira dimensão da tragédia, que exige declaração de desgraça social, com a devida e inadiável decretação de estado de guerra contra a triste calamidade humanitária, mas, ao contrário disso, ela que vem sendo tratada com absoluta tranquilidade, a exemplo do que nada é feito pelo principal órgão incumbido de cuidar, de maneira prioritária, da saúde pública, que nem ministro tem, por quase um ano que os estridentes e mortais bombardeios vêm caindo, cruel e impiedosamente, nas cabeças da população.

Diante do caos instalada na saúde dos brasileiros, o mandatário tem a mente povoada não somente pelos fantasmas do impeachment, mas por quem teme ser jogado no lixo seu plano de reeleição, com a irrecuperável perda da credibilidade popular, que despenca por força da inércia administrativa, demonstrada pela omissão no combate à pandemia, a ponto do suscitamento da decretação do estado de sítio ou atos institucionais com o intuito de botar sob rédeas curtas o controle das medidas de isolamento social, comandadas pelos governadores.

A sociedade não tem motivo algum para esperança sobre a premente cessação dos bombardeios que atormentam a sua paz, diante da permanente desorientação que somente tem capacidade para boicotar as medidas sanitárias contra a Covid-19, em especial de isolamento, desde o princípio, a par da alimentação da paranoia contra ele, o tempo todo, sob alegações de “governadores e prefeitos embolsaram os repasses para o combate à pandemia e lucram com o caos”; “vacina produz morte e invalidez”; “isolamento é ditadura”, além de tantas afirmações negacionistas que somente contribuem para disseminar descrédito perante a população, que espera atitude proativa contra a doença.

A propósito, convém assinalar o pronunciamento de outros argumentos destituídos de nexo nem evidência real ou científica, atribuídos à principal autoridade do país, como os seguintes: “vírus pega quem está em casa também”; “isolamento não funcionou em lugar nenhum do mundo”; “fila de hospital sempre existiu, mas agora é explorada por razões políticas”; “meu primo pegou e não morreu”; “a fome mata mais”; “estão tratando quem quer trabalhar como bandido”; “decreto inconstitucional não está acima da minha liberdade de ir, vir, me contaminar e contaminar quem eu quiser”.

Diante da gigantesca dimensão da tragédia humanitária, nada do que foi dito acima faz o menor sentido, em termos de responsabilidade quanto aos cuidados da saúde dos brasileiros, como tentativa de justificar a enormidade da incompetência, da omissão e do desprezo à desgraça que impera com a força devastadora da Covid-19.

Os desnecessários e prejudiciais ataques apenas alimentam a extensão da tragédia e contribuem para desanimar e minar a esperança de dias melhores para a saúde dos brasileiros, justamente porque são evidentes os sinais de desestímulo que partem da principal autoridade que tem a incumbência de dar o grito de guerra contra a Covid-19, mas as suas atitudes enveredam por caminhos não de saneamento do mal, tendo, ao contrário, o cabimento de ideias absurdas de combatê-lo por meio da decretação de estado de sítio, que ainda conta com o apoio da turba fanática e enlouquecida, também completamente insensível aos apelos de imediata cessação dos bombardeios contra a população, por meio de medidas condizentes com os fatos terríveis.

Enfim, a realidade dos fatos mostra que a desesperança no porvir é fruto da total perda de perspectiva, que tem sido fortalecida com a vacinação tardia e lenta e mais ainda por força da demonstração de desinteresse em enxergar a gravidade e a letalidade do coronavírus, fatos estes que contribuem para a falta da adoção das necessárias e urgentes medidas sanitárias, ficando cada vez mais difícil manter, ainda que minimamente, fio de esperança à vista dos efeitos práticos e efetivos da negação que vem sendo alimentada pelo deformado senso de coletividade e solidariedade.

Brasília, em 22 de março de 2021

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