sábado, 19 de agosto de 2017

A banalização de titulo universitário

A Justiça Federal da Bahia suspendeu a concessão do título de doutor honoris causa ao ex-presidente da República petista pela Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, que seria entregue em solenidade inserida nos eventos da caravana liderada por ele, no Nordeste.
A aludida decisão foi proferida por juiz da 10ª Vara Cível, em ação popular impetrada na Justiça, que argumentou se tratar de ato ilegal e lesivo ao patrimônio público e que "O ato administrativo de concessão do título honorífico de Doutor Honoris Causa ao ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva parece configurar desvio de finalidade revelador de ofensa à moralidade administrativa".
Segundo o juiz, a concessão da honraria foi feita em processo rápido, que não atendeu aos requisitos administrativos necessários, além de ter sido com base em proposta de membros do Conselho Universitário, enquanto o regimento da instituição determina que ela deve ser feita, devidamente justificada, pelo reitor e aprovada por 2/3 dos membros presentes à reunião.
O juiz disse que "A honraria foi conferida ao réu Luiz Inácio Lula da Silva por provocação do próprio Conselho Universitário, o qual também apreciou a proposição e a aprovou em hostil violação da regra administrativa antes transcrita, o que certamente também aparenta ladear a moralidade administrativa. No ponto, a proteção constitucional à moralidade administrativa consagrada no artigo 5º, inciso LXXIII, da Carta Política, tem como matriz a preservação do patrimônio público onde nele repousa o de cunho moral".
Segundo a universidade, a "decisão judicial fere um dos princípios fundamentais das universidades públicas que é a autonomia universitária. Reza a Constituição Federal que 'Art. 207 – As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão'. Portanto, a quebra da autonomia universitária gera perigoso precedente, de consequências danosas, para todas as universidades públicas brasileiras".
A nota da UFRB diz ainda que "a honraria ao ex-presidente Lula é um antigo desejo de setores da comunidade universitária da UFRB, pela implicação do seu governo com a expansão e a interiorização do ensino público superior. Oportunamente, com a agenda pública do ex-presidente comunicando passagem pela Bahia e por Cruz das Almas, cinco membros do CONSUNI propuseram a concessão do título honorífico, conforme artigo 9º da resolução CONSUNI nº 006/2011, que regulamenta a concessão de títulos desta natureza".
Como é sabido, o título de doutor honoris causa significa, literalmente, “por causa de honra” e normalmente é utilizado por universidade de prestígio para homenagear celebridades com título de honra em reconhecimento por algo que elas tenham feito em benefício do desenvolvimento social.
No exato momento, não parece que a concessão do título de doutor honoris causa se harmonize com a verdadeira finalidade da outorga, que significa exatamente "por causa de honra", quando o laureado acaba de ser condenado à prisão, por possível prática dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, conforme sentença lavrada pelo juiz da Lava-Jato, o que significa que, em termos de honra, o político precisa comprovar, com provas juridicamente válidas, a sua inculpabilidade na denúncia transformada em prisão, quando então, por certo, poderá se habilitar ao título em comento.
Caso contrário, não há a menor dúvida de que não passa do “jeitinho” brasileiro de se conceder título honorífico apenas pelo bel-prazer de se fazer média, por meio de instrumento que realmente tem o seu valor depreciado, em se tratando de que a sua outorga, em princípio, precisa ser por merecimento e por justa causa, evidentemente em valorização do mérito do doutorando, que, em compensação, corresponde em prestígio para a universidade que concedeu o título em obediência aos princípios de seriedade e justiça, a justificar plenamente a medida.
É evidente que não se pode fazer juízo de valor sobre os títulos questionados na Justiça e fora dela, mas o bom senso sinaliza que, nas circunstâncias, a concessão de títulos de doutor honoris causa a quem se encontra envolvido com vários casos de denúncias na Justiça, inclusive respondendo como réu e já tendo sido condenado à prisão, tem o condão de reduzir a muito pouca expressão o significado da honraria, deixando de corresponder à sua real finalidade de honrar mutuamente a universidade e o doutorando, em reconhecimento pelo que ele possa ter feito em benefício da humanidade, que é exatamente essa a finalidade da concessão do título em causa.
          Polêmica judicial à parte, convém que se avalie o verdadeiro mérito da concessão, que, em princípio, precisa se adequar à finalidade da honraria e não deveria se confundir com objetivos políticos e ideológicos, como parece que é o caso em comento, uma vez que o título foi aprovado depois da decisão sobre a realização da caravana do político pela região nordestina, ou seja, trata-se de arranjo de cunho estritamente político, sem vinculação com o propósito da sua instituição primacial, de homenagem por legado ou por algo que tenha contribuído para o bem comum da sociedade. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 19 de agosto de 2017

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