sexta-feira, 18 de agosto de 2017

A sapiência da Justiça

O maior político do país, que foi recentemente condenado pelo juiz da Lava-Jato a nove anos e seis meses de prisão, pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, reafirmou sua inocência nas ações penais que responde na Justiça.
Em ato promovido pela Central Única dos Trabalhadores, no Rio Janeiro, ele declarou, sob aplausos, que "Por que eu iria envergonhar milhões de brasileiros, a quem reverencio todos os dias? Eu não estou acima da lei, mas o juiz também não está. Já provei a minha inocência, quero que provem que tenho R$ 1 que não é meu. Querem criminalizar a esquerda e o PT. Vou brigar para ser candidato em 2018 e vou mostrar que esse país vai voltar a sorrir, a ter a Petrobrás, a ter indústria naval (cic)".
Ele não poupou críticas às reformas do governo peemedebista e repetiu a intenção de regular a imprensa, caso seja eleito, nestes termos: "Esse país voltou a ser o que sempre foi, e que mudou com a gente. Todo o objetivo dessa perseguição ao PT, essa reforma da Previdência e Trabalhista, tudo é para tentar destruir o que conquistamos há mais de 60 anos (sic). Querem evitar que o Lula volte. Não têm competência para fazer o Brasil crescer, o que nós provamos que sabemos fazer. Tivemos a Previdência superavitária. A falta de dinheiro na Previdência é resultado da incompetência dessa gente que está hoje destruindo o país...".
Ele voltou a criticar os meios de comunicação, tendo afirmado que "Eu nem vejo mais televisão, nem leio mais jornais, porque todo dia é uma desgraceira contra o Lula. Querem que a sociedade esqueça que o Lula existiu".
Em seguida, o petista não se conteve e se comparou, pasmem, a Tiradentes, ao afirmar que "O engano deles é achar que existe um ser humano insubstituível. Em 1792, mataram Tiradentes, esquartejaram ele, salgaram ele, para que ninguém nunca mais pensasse em independência no Brasil (sic). O problema deles não é o Lula. Eles estão enganados. É enfrentar as milhões de pessoas que querem ter direitos (sic)", tendo concluído que também foi "esquartejado" e "salgado".
No caso lamentável e imperdoável do maior herói nacional, o mártir Tiradentes, a imolação pública foi justificada por causa das mais nobres atitudes dele em defesa dos interesses do Brasil, conquanto o “esquartejamento” do político de agora teria possivelmente motivação algo exatamente contrário às causas  nacionais, à vista da roubalheira disseminada nos recrimináveis escândalos do mensalão e petrolão, ocorridos justamente nos governos de quem se julga injustiçado, embora os resultados dos levantamentos e das investigações da Polícia Federal, do Ministério Público Federal e a Justiça Federal não deixem dúvidas sobre a sua participação nos fatos deletérios e prejudiciais aos interesses do pais.
Fato é que, a bem da verdade, de inocência propriamente, nada foi até o momento ainda comprovado, considerando, ao contrário, que o político já foi condenado pelo juiz da Lava-Jato à prisão, no caso do tríplex do Guarujá, que, segundo a sentença pertinente, ele foi pago por meio de propina da empreiteira OAS, além de ele continuar vinculado à Justiça, respondendo como réu a, pelo menos, outros cinco processos, por vários crimes não condizentes com atividades político-partidárias.
Em outro evento, na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro, para marcar o lançamento do livro "Comentários a uma sentença anunciada: o processo Lula", com artigos de juristas organizados por professores de Direito, o político disse que integrantes da força-tarefa da Lava-Jato compõem um partido político e que a esquerda precisa "juntar os cacos" para vencer em 2018.
Por natureza, os inocentes são humildes, compreensivos e serenos, porque sabem que não devem nem precisam provar nada a ninguém, porque os fatos falam por si sós e a Justiça tem a sapiência suficiente para avaliá-los com a devida serenidade dos justos, para o fim de proclamar a inculpabilidade de que for realmente merecedor de tal benefício.
Pelo menos nos países sérios e civilizados, onde os políticos são absolutamente cônscios da sua responsabilidade cívica e pública, não existe a menor possibilidade, em termos de razoabilidade e plausibilidade, de alguém declarar já ter provado sua inocência com cabedal de complicação na Justiça, como no caso da comprovada situação adversa de ter sido recém-condenado em um processo à prisão, ou seja, com culpa formada, e ainda responder a cinco processos na Justiça, como réu, i.e., com denúncia aceita formalmente pelas suspeitas das práticas dos graves crimes de tráfico de influência, obstrução de Justiça, organização criminosa, corrupção passiva, lavagem de dinheiro, que são indiscutivelmente incompatíveis com a dignidade que se exige dos homens públicos, que precisam comprovar, de forma permanente, idoneidade e conduta ilibado, para o exercício de cargos públicos.
Não há a menor dúvida de que homem público com tal raciocínio mostra-se alheio à realidade dos fatos e acena por possuir enormes dificuldades para compreender a real dimensão do imbróglio representado pelas demandas em tramitação na Justiça, que são fruto de suspeitas de irregularidades graves, transformadas em investigações, cujos resultados são denunciados ao Judiciário, que julga as ações com base em provas materiais e substanciais.
Caso contrário, quando o magistrado julgar com base em provas inexistentes  ou elementos precários, sem o imprescindível atendimento dos requisitos legais, ele comete crime de prevaricação, por condenar alguém sem a devida observância à confirmação da materialidade, das provas substanciais legalmente válidas, o que significa dizer, com isso, que não vale a pena os verdadeiros inocentes ficarem esbravejando e agredindo aqueles que os julgam, porque o remédio da reparação da injustiça se encontra na própria Justiça, que não pode deixar de cumprir a sua nobre missão institucional de julgar os casos sob a sua competência jurisdicional, mesmo que os envolvidos sejam integrantes da nata da ainda poderosa política nacional. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 18 de agosto de 2017

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