Em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, o magistrado responsável pela Operação Lava-Jato
afirmou que não há interesse da classe política para combater a corrupção,
tendo também rebatido as críticas sobre a concessão de benefícios para réus que
ainda estão negociando delação premiada.
O juiz disse que "Lamentavelmente, eu vejo uma ausência de um discurso mais vigoroso por
parte das autoridades políticas brasileiras em relação ao problema da
corrupção. Fica a impressão de que essa é uma tarefa única e exclusiva de
policiais, procuradores e juízes".
Ele aproveitou o ensejo para também defender o
levantamento do sigilo da interceptação telefônica da conversa entre o maior
líder petista e a então presidente do país, em 2016, ao afirmar que "as pessoas tinham direito de saber a
respeito do conteúdo daqueles diálogos".
O magistrado fez questão de esclarecer que há efetivas
provas para a incriminação do político petista, por nove anos e seis meses de
prisão, quando afirmou que "Sobre a
sentença do ex-presidente, tudo o que eu queria dizer já está na sentença, e
não vou fazer comentários. Teoricamente, uma classificação do processo penal é
a da prova direta e da prova indireta, que é a tal da prova indiciária. Para
ficar num exemplo clássico: uma testemunha que viu um homicídio. É uma prova
direta. Uma prova indireta é alguém que não viu o homicídio, mas viu alguém
deixando o local do crime com uma arma fumegando. Ele não presenciou o fato,
mas viu algo do qual se infere que a pessoa é culpada. Quando o juiz decide,
avalia as provas diretas e as indiretas. Não é nada extraordinário em relação
ao que acontece no cotidiano das varas criminais".
Em resposta às ácidas críticas de um ministro do Supremo
Tribunal Federal à Lava-Jato – afirmando
que a operação criou um "direito
penal de Curitiba", com "normas
que não têm a ver com a lei" -, o juiz afirmou que não faria réplica
ao discurso do ministro, mas justificou que "Não seria apropriado. Juízes têm entendimentos diferentes. Não
obstante, nos casos aqui julgados, não há direito extraordinário. Na Lava-Jato,
para a interrupção do ciclo de crimes, era necessário tomar algumas medidas
drásticas – entre elas, por exemplo, as prisões antes do julgamento. E as
decisões têm sido, como regra, mantidas".
Sobre algo que possa representar ameaça à Lava-Jato,
o juiz federal considera que há "ausência
de um discurso mais vigoroso por parte das autoridades políticas brasileiras em
relação ao problema da corrupção. Fica
a impressão de que essa é uma tarefa única e exclusivamente de policiais,
procuradores e juízes. No Brasil, estamos mais preocupados em não retroceder,
em evitar medidas legislativas que obstruam as apurações das responsabilidades,
do que propriamente em proposições legislativas que diminuam a oportunidade de
corrupção. Vejo no mundo político uma grande inércia".
Questionado por A
Folha sobre as escutas que envolveram os citados ex-presidentes do país,
nestes termos: "O sr. escreveu que o
conteúdo revelava tentativas de obstruir investigações. É possível entender que
a medida de tornar público esse conteúdo tinha como objetivo proteger a Lava-Jato?",
o juiz respondeu que “a decisão sobre o
levantamento do sigilo foi pensando no direito das pessoas em saber a respeito
do conteúdo. A escolha adotada desde
o início desse processo era tornar tudo público, desde que isso não fosse
prejudicial às investigações. O que aconteceu nesse caso (dos grampos dos
ex-presidentes petistas) não foi nada
diferente dos demais. As pessoas tinham direito de saber a respeito do conteúdo
daqueles diálogos. E por isso que foi tomada a decisão do levantamento do
sigilo. Um efeito indireto ao dar publicidade para esses casos foi proteger as
investigações contra interferências indevidas. Afinal de contas, são processos
que envolvem pessoas poderosas, política e economicamente. Na prática, pode
haver tentativas. Então, tornar tudo público também acaba funcionando como uma
espécie de proteção contra qualquer obstrução à Justiça. E isso é muito
importante. Foi seguida a Constituição. Dentro de uma democracia liberal como a
nossa, é obrigatório que essas coisas sejam trazidas à luz do dia".
Finalmente, o juiz da Lava-Jato foi indagado se o
crime compensaria no Brasil, considerando que, sob seu comando, há mais de 150
acordos de delação premiada e muitos dos colaboradores ficarão presos por dois
anos e parte dos criminosos logo estará livre nas ruas.
Ele disse que "A colaboração de criminosos vem com um preço: ele não colabora senão
pela obtenção de benefícios. Isso faz parte da natureza da colaboração. Muita
gente não tem acordo nenhum, continua respondendo aos processos, alguns foram
condenados, estão presos. Essas pessoas também vão sair da prisão um dia. Faz
parte do sistema. O que acho que tem que ser comparado é que, no passado, como
regra, o que havia era a impunidade. As pessoas nem sequer sofriam as
consequências de seus crimes. Em muitos casos, nem sequer eram descobertas. A
sensação de impunidade era ainda maior".
O que se verifica de importantes dos resultados das
questões respondidas pelo magistrado da Lava-Jato são lições de inteligência e
sabedoria jurídicas, mostrando que aqueles que se achavam sumidade na ciência
do Direito se surpreenderam com a coragem, a dinâmica e a perspicácia da
aplicação do regramento jurídico na busca da verdade e do combate à corrupção e
à impunidade, deixando o mundo político, assoberbado de bandidos, atordoado e
tolhido na sua principal arte de enganar a Justiça, quando se sabe que, antes
da Operação Lava-Jato os criminosos de colarinho-branco nunca ou dificilmente
eram condenados e ocupantes de cadeia.
É mais do que verdadeiro que, “No Brasil, estamos mais preocupados em não retroceder, em evitar
medidas legislativas que obstruam as apurações das responsabilidades, do que
propriamente em proposições legislativas que diminuam a oportunidade de
corrupção.”, porque qualquer projeto legislativo objetivando a proteção dos
corruptos e da impunidade, que normalmente beneficia diretamente parcela
significativa dos congressistas, é aprovado em caráter urgência e de prioridade e ainda sob os aplausos dos
principais envolvidos em casos de corrupção contra a dignidade e o decoro
parlamentar.
Não à toa que a Justiça brasileira passou a ter
duas caras, uma horrível, incompetente, irresponsável, que tinha a fama de não
cumprir a sua missão institucional, diante da eterna morosidade e da prática de
somente jugar ladrões de galinhas, afrodescendentes e pobres, e outra que
passou a julgar, de forma prioritária, também os criminosos tubarões, como
políticos da maior relevância da República, executivos e empresários, que eram
ilustres criminosos que tinham bons causídicos e permaneciam impunes por seus
gravíssimos crimes, como os de que trata o petrolão, onde o grosso da classe
política se encontra envolvida, mas faz manobras no Congresso Nacional, na
tentativa de escapar das garras da Justiça.
Embora largamente criticado pelos famosos criminosos
de colarinho-branco, obviamente diante da implacabilidade de seus julgamentos,
o juiz da Lava-Jato nada mais faz do que cumprir o seu dever funcional e
institucional de observar e aplicar os ditames do ordenamento jurídico pátrio, com
base nos elementos coligidos e inseridos nos autos, conforme a esmagadora
confirmação, por instâncias superiores, de suas qualificadas e justas
sentenças.
Convém que as lições de competência, experiência e
efetividade da lavra do incansável magistrado da Operação Lava-Jato sejam espargidas
no seio dos integrantes do Poder Judiciário, como forma de bem cumprir a sua
missão institucional de amor ao Brasil, cuja Justiça ainda precisa evoluir bastante
para reduzir a criminalidade, com a condenação dos bandidos, inclusive de
colarinho-branco que assolam este país e aterrorizam os brasileiros. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 3 de agosto de 2017
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