terça-feira, 22 de agosto de 2017

Protagonismo político?

Uma herdeira da família fundadora do banco Credit Suisse decidiu, em ato de extrema magnanimidade, lançar movimento de apoio financeiro ao ex-presidente da República petista, em razão do bloqueio de seus bens, no valor de R$ 16 milhões, pelo juiz da Lava-Jato, para a garantia de multa que lhe foi aplicada no bojo da condenação de nove anos e seis meses de prisão, no caso do tríplex do Guarujá (SP).
A neta do banqueiro suíço se dispôs, inicialmente, a abrir a bolsa, o closet e o cofre para fazer doação pessoal ao petista, no valor de cerca de R$ 500 mil em dinheiro, joias e objetos de valor, cuja quantia, diante da repercussão mais que polêmica, foi dobrada para R$ 1 milhão.
Ela justifica sua generosidade, ao afirmar que, "Com o bloqueio dos bens de Lula, Moro tenta inviabilizá-lo tanto na política quanto pessoalmente. Vou fazer uma doação para que o presidente possa usar conforme as necessidades dele", esquecendo ela que o político teve o valor de R$ 10 milhões em planos de previdência e contas bancárias bloqueados, ou seja, quem tem esse valor, em princípio, não precisa de doação de espécie alguma.
Ela teria sacado da bolsa Hermès cheque, ao portador, no valor de 28 mil francos suíços (cerca de R$ 91 mil), oriundo da mesada que recebia do avô morto recentemente, tendo esclarecido, em tom de ironia, que "Foi o último cheque que recebi dele e vou repassar integralmente ao Lula. Agora, já podem dizer que ele tinha conta na Suíça, aquela que os procuradores da Lava-Jato tanto procuraram e não acharam".
A herdeira bilionária recheou uma mala da marca Rimowa de objetos que o ex-presidente poderá transformar em dinheiro, tais como, entre outros, um relógio Rolex (R$ 100 mil) e um anel de diamantes da joalheira Emar Batalha (R$ 145 mil), que enfeitou um editorial da revista Vogue, afirmando que "Lula vai poder penhorar tudo".
Na referida mala, que ela pretende entregar pessoalmente, há ainda objetos de desejo de blogueiras e "it girls", como uma bolsa Chanel (R$ 32 mil), um par de sandálias Christian Louboutin (R$ 3 mil) e um vestido Dolce & Gabbana (R$ 30 mil), que "São itens que poderão ser leiloados em um evento em benefício ao ex-presidente".
Também foi incluída uma bandeja de prata, com o brasão da família Luchsinger, que segundo a doadora, é forma de protesto pelo confisco dos presentes que o político recebeu de chefes de Estado quando estava na Presidência da República.
A doadora justifica a sua ação com críticas ao que qualifica de "excessos" e "seletividade" da cruzada anticorrupção empreendida pela força-tarefa da Operação Lava-Jato, por considerar que "É indevido esse protagonismo político da Lava-Jato, que fere o sistema de pesos e contrapesos entre os poderes da República. Perseguir o Lula é perseguir o povo brasileiro.".
A aludida doadora, que pretende fazer carreira política no Partido Comunista do Brasil, disse que "Esse ódio exacerbado contra os partidos de esquerda, principalmente contra o PT, chegou ao ponto de cegar parte da sociedade. Virou moda se referir a Lula como ladrão. Esses que hoje o demonizam se esquecem de que Lula foi bom para os pobres e também para os ricos e deixou a Presidência com 90% de aprovação.".
Ela disse que não vê incompatibilidade entre seu estilo de vida sofisticado e a pregação de sociedade igualitária e sem classes sociais preconizadas pelos comunistas.
Ao que se tem notícia, o arroubo da comunista de tentar criar o que já foi denominado “Bolsa Lula” não sensibilizou ninguém para acompanhá-la no seu gesto generoso, quando se sabe que o recebedor das doações não está tão carente assim, diante das gordas contas bancárias de quase 10 milhões de reais, somente do que se tem conhecimento, ante o bloqueio desse valor.
Ao que tudo indica, trata-se de caso de puro fanatismo, na tentativa de aparecer na mídia, em forma de protesto contra os trabalhos com a competência comprovada da Operação Lava-Jato, que tem o exato objetivo de mostrar a verdade que as pessoas da esquerda procuraram ocultar, quando agem em defesa de quem já foi até condenada à prisão pela prática de atos ilícitos.
Causa perplexidade afirmação como essa de que “Esse ódio exacerbado contra os partidos de esquerda, principalmente contra o PT, chegou ao ponto de cegar parte da sociedade...”, considerando que os integrantes desses partidos fazem questão de odiar quem não comunga com a sua ideologia, fato esse que contraria o princípio democrático de livre pensamento e de escolha e defesa da ideologia que melhor se adeque à sua filosofia de vida.
Isso vale dizer simplesmente que não existe ódio de coisa alguma, salvo por parte de quem imagina que a esquerda é algo pecaminoso, fato que não se pode discutir em termos de preferência política, uma vez que os partidos, no Estado Democrático de Direito, são todos iguais perante a lei, sendo diferentes, como não poderia deixar de ser, são as suas ideologia e filosofia, por integrarem o seu programa institucional.
Agora, sob a ótica estritamente comunista, que prega a congregação de sociedade igualitária, a doação em comento é simplesmente uma bofetada na cara de quem acredita nessa vã filosofia tão desacreditada, quando, em princípio, ela deveria distribuir seus trocadinhos de um milhão de reais para a pobreza, que realmente carece de recursos, mas a sua preferência se destinou justamente para o bolso de quem já dispõe de fortuna, dando a verdadeira conotação de seus reais objetivos de aparecer na mídia.
Outra situação extremamente estranha diz respeito à frase pronta como esta de que “Perseguir o Lula é perseguir o povo brasileiro”, como se o político fosse a encarnação do próprio povo, quando tem personalidade própria e precisa responder por seus atos, por força das obrigações ínsitas de todos os homens públicos, que têm o dever constitucional e legal de prestar contas sobre suas atividades na vida pública.
No caso dos processos onde ele se encontra respondendo por denúncia sobre suspeita da prática de atos irregulares, isso faz parte dos procedimentos próprios do Estado Democrático de Direito, onde os fatos, em princípio, suspeitos de irregularidades precisam ser investigados e os envolvidos são obrigados, se for o caso, a justificar situações carentes de esclarecimentos, inclusive por meio da ampla defesa e do contraditório, na forma legal, onde as questões são normalmente contestadas por meio de provas juridicamente válidas, como acontece normalmente nas nações sérias e civilizadas, cujo resultado das avaliações podem até contribuir para aumentar o prestígio dos políticos, evidentemente quando eles simplesmente se dignam a aceitar a realidade da situação e conseguir demover todas as acusações, por meio de provas materiais, em harmonia com os princípios da transparência e da legalidade.        
Em nenhum país civilizado, há a possibilidade de político, por mais relevante que seja, ser considerado perseguido ou vítima pelo simples fato de ser investigado sob suspeita da prática de atos irregulares, porque isso, no mundo moderno, além de ser difícil de acontecer, faz parte do ritual indispensável à elucidação dos fatos, com vistas à revelação da verdade, em atendimento aos salutares princípios da transparência e da dignidade ínsitos dos homens públicos, que normalmente exigem que as investigações sejam devidamente procedidas para o bem da verdade.
Convém que os brasileiros tenham consciência cívica e patriótica para o fim de se exigir dos homens públicos a compreensão sobre a necessidade de assumir seus erros e ter a dignidade de prestar contas, na forma legal, de seus atos na vida pública, independentemente de ter ocupado os principais cargos da República, conquanto mais elevados que eles tenham sido mais acresce a responsabilidade pela comprovação da lisura e da decência nas atividades públicas. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 22 de agosto de 2017

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