Diante da sentença
proferida pelo juiz da Operação Lava-Jato, condenando o ex-presidente da
República petista a nove anos e seis meses de prisão, pelos crimes de corrupção
passiva e lavagem de dinheiro, alguns especialistas de direito foram ouvidos
pela Folha de S.Paulo, na tentativa
de avaliá-la quanto aos acertos e aos deslizes que possam ter sido cometidos,
segundo o ponto de vista jurídico.
Alguns juristas entendem
que o juiz da Lava-Jato extrapolou a sua função ao ter recriminado a defesa do
petista pelas críticas feitas aos investigadores e à Justiça, por entenderem
que isso faz parte do sistema democrático de manifestar insatisfação sobre
determinado procedimento.
Na sentença, o juiz disse
que "até caberia cogitar a
decretação da prisão preventiva" do ex-presidente, dadas as "táticas bastante questionáveis como de
intimidação do julgador" e "de
outros agentes da lei" com ações de indenização e declarações "no mínimo inadequadas".
Contrariando o juiz, um
professor de direito disse que "É
absolutamente equivocada e fora de lugar. Lula tem o direito de denunciar o que ele entende ser um processo
injusto, não pode ser amordaçado, e a defesa não pode ser impedida de invocar
essa tese porque incomoda Moro ou elimina, no seu entender, o prestígio e a
autoridade moral do processo.".
Outro ponto bastante
criticado por especialistas diz respeito à afirmação do magistrado de que todos
são iguais perante a lei, mas, em se tratando de ex-presidente do país, a
decretação da prisão foi simplesmente delegada à segunda instância, quando ele
mesmo poderia ter decidido pela reclusão do político.
O juiz da Lava-Jato escreve
que, "considerando que a prisão
cautelar de um ex-presidente não deixa de envolver certos traumas, a prudência
recomenda que se aguarde o julgamento pela corte de apelação antes de se
extrair as consequências próprias da condenação (a prisão)".
Um jurista entende que o
juiz foi contraditório, tendo afirmado: "Ora, ele mesmo diz na própria sentença que a lei é igual para todos,
mas, nesse caso, deixa de prender porque causaria comoção. O critério pode ser qualquer coisa, menos
jurídico.".
Um professor da USP disse
que, ainda que não haja prova inquestionável que incrimine o ex-presidente, “a interpretação do juiz se baseou não apenas
em depoimentos, mas também em documentos. A sentença, em si, me parece absolutamente adequada, ainda que você
possa ter divergência aqui ou ali na interpretação da lei ou dos fatos".
Outro festejado jurista internacional
afirmou que a peça é "muito bem
fundamentada" e apresenta "matéria
fática importante", com provas, tendo acrescentado que o juiz da
Lava-Jato "foi extremamente
cauteloso em afastar os argumentos dos advogados do Lula de suspeição de
condução".
Outros especialistas disseram
que a fixação da pena levou em conta critérios além de subjetivos, alheios ao
caso julgado, o que configura erro técnico.
Um professor questionou o
cálculo da pena fixada de cinco anos de reclusão por crime de corrupção
passiva, cuja pena pode variar de 2 a 12 anos de prisão, mas o juiz argumentou
que a prática se insere em "esquema
de corrupção sistêmica na Petrobras", do qual o PT teria obtido R$ 16
milhões.
Observa-se que, no contexto
geral, o juiz da Lava-Jato se houve, nesse episódio, com muito mais acerto do
que deslizes, demonstrando que a punição ao petista pode ter sido no tamanho ou
próximo da pena por ele merecida, à vista da efetiva prática de atos contrários
aos princípios republicanos que os homens públicos precisam observar com
absoluta fidelidade, como acontece nos países sérios, civilizados e evoluídos
política e democraticamente.
O que importa mesmo é que o processo
teve desfecho na primeira instância e ainda precisa passar pelo crivo do
Tribunal de apelação, para se confirmar ou não a condenação do ex-presidente,
de modo que, sendo ela chancelada, o seu veredicto se torne paradigma para punir
com severidade os agentes políticos inescrupulosos, que sempre atuaram na
certeza de que jamais seriam apanhados
pela Justiça, porque o mais importante é que a punição seja aplicada
indistintamente a todos homens públicos, não importando a relevância da sua
autoridade no cenário nacional, de modo que os corruptos sejam devidamente
enquadrados e punidos.
Em se tratando de sentença,
dificilmente alguma será considerada absolutamente perfeita, sob a ótica dos
princípios jurídicos, tanto assim é que existem os tribunais de apelação,
exatamente para que ela possa ser revista e aprimorada, como forma de se evitar
injustiça, ou seja, a possibilidade de recurso visa eventual correção sobre
aspectos materiais e jurídicos, próprios da praxe jurídica.
Ainda que a sentença condenatória
do ex-presidente não seja obra-prima, no sentido eminentemente jurídica, o
recurso de apelação ao TRF-4 terá o condão de aperfeiçoá-la, quer para
mantê-la, modificá-la ou anulá-la, conforme a circunstância, à vista do entendimento
dos desembargadores, que vão sopesar os argumentos elencados pelo magistrado de
Curitiba.
É evidente que a sentença
em tela não seria tão criticada se as provas sobre os crimes da corrupção e da lavagem
de dinheiro tivessem deixado seus rastros, por meio de recibos, documentos,
demonstrativos, planilhas, assinatura de seu autor, entre outras evidências
incontestáveis, mas os elementos levantados e apontados nos autos acenam para
conclusões suficientes para a materialização dos crimes neles configurados.
Embora passível de crítica, os pontos básicos
da sentença guardam o necessário respaldo jurídico com os fatos denunciados,
demonstrando que o juiz da Lava-Jato se houve implacável contra a corrupção
disseminada na Petrobras, causando imensurável estrago ao seu patrimônio, não
se intimidando com as ameaças recebidas no desempenho de seu mister.
É notório que a prisão do ex-presidente,
no momento, poderia causar não comoção nacional, mas alguma forma de
transtorno, diante do seu indiscutível carisma no seio de grupos e organizações
sociais, sendo prudente evitá-la.
Não há dúvida que a
sentença em tela até pode ter causado polêmica, o que é normal, em se tratando
do envolvimento do principal político nacional, mas notáveis juristas avaliam,
na essência, que a peça acha-se muito bem fundamentada, apresenta matéria
fática importante, com provas, e afasta, de forma cauteloso, os argumentos dos
advogados sobre a suspeição de condução da causa, tudo a respaldar a decisão
judicial, na primeira instância, conquanto os possíveis deslizes incorridos
pelo magistrados não têm o condão de macular o fundamento das denúncias.
Na sentença, com mais de 200 laudas, o juiz da
Lava-Jato resume as acusações sobre a prática de crimes cuja autoria é
atribuída ao ex-presidente, com base nos argumentos da defesa e na análise das provas documentais (demonstrativos, documentos, fotos, imagens, e-mails e mensagens telefônicas), pericias (documentos periciados e testemunhais) e depoimentos.
Urge que a Justiça cumpra a
sua importante missão institucional de também zelar pela moralização da
administração do país, ao julgar, com independência e autonomia constitucionais,
as ações submetidas à sua jurisdição, tendo como alvo a defesa do interesse
público, não importando a relevância dos envolvidos, uma vez que as leis do
país precisam ser aplicadas e respeitadas na sua plenitude, em harmonia com a
evolução da humanidade. Acorda, Brasil!
ANTONIO
ADALMIR FERNANDES
Brasília, em 8 de agosto de
2017
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