sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Deplorável questionamento

Dois ministros do Supremo Tribunal Federal discutiram e trocaram ofensas, de forma acirrada, na sessão da Corte, no momento do julgamento sobre a validade da decisão que envolve a extinção de tribunais de contas de municípios do Estado do Ceará.
O estopim para o início da briga ocorreu após um ministro criticar, sem a mínima necessidade, a situação financeira do Rio de Janeiro, estado de origem do outro magistrado.
O ministro carioca questionou se, no Mato Grosso, estado do outro ministro “está tudo muito preso”, em referência aos políticos presos no Rio de Janeiro e complementou dizendo: “Nós prendemos, tem gente que solta”.
Em resposta, o ministro mato-grossense, que ficou célebre nos últimos tempos por soltar vários presos pela Operação Lava-Jato, disse que o colega, ao chegar ao Supremo, “soltou José Dirceu”, ex-ministro do governo petista e condenado no escândalo do mensalão.
Em resposta, o ministro carioca chamou o colega de mentiroso, ao afirmar que “É mentira. Aliás, normalmente, Vossa Excelência não trabalha com a verdade. Então gostaria de dizer que José Dirceu foi solto por indulto da Presidência da República”.  Ele disse ainda que o petista só está solto por causa de decisão da Segunda Turma do STF, da qual integra o ministro mato-grossense.
A troca de farpas continuou com o ministro carioca dizendo que o ministro mato-grossense “não julga, não fala coisas racionais e vive atacando alguém. Vossa Excelência fica destilando ódio o tempo inteiro. Não julga, não fala coisas racionais, articuladas. Sempre fala coisa contra alguém, está sempre com ódio de alguém, está sempre com raiva de alguém. Use um argumento. Vossa Excelência devia ouvir a última música do Chico Buarque: a raiva é filha do medo e mãe da covardia”.
Em seguida, os ministros foram interrompidos pela presidente da Corte, porém eles continuaram discutindo, quando, ao tentar encerrar a discussão, a presidente lembrou aos colegas que eles estavam “no plenário de um Supremo Tribunal” e que ela gostaria de voltar ao caso em julgamento. Tudo em Vão.
Na parte mais acalorada do bate-boca, ao explicar as razões pelas quais concedeu indulto ao ex-ministro petista, o ministro carioca acusou seu colega de ser parcial em suas decisões, ao afirmar que “Não transfira para mim essa parceria que Vossa Excelência tem com a leniência em relação a criminalidade do colarinho branco”.
Ao rebater as declarações do ministro carioca, o mato-grossense disse que “Tenho compromisso com direitos fundamentais. Não sou advogado de bandidos internacionais”, em referência ao trabalho daquele como defensor, evidentemente antes de ser nomeado para ministro do Supremo, do ex-ativista italiano que está prestes a ser extraditado.
Agora já na tréplica, o carioca disse ao mato-grossense que “Vossa Excelência vai mudando a jurisprudência de acordo com o réu. Isso não é Estado de Direito, isso é Estado de compadrio. Juiz não pode ter correligionário”.
Após serenada a “sessão” bate-boca, o julgamento foi retomado e concluído, tendo sido mantida a decisão da Assembleia Legislativa do Ceará, que extinguiu os tribunais de contas dos municípios do estado.
A discussão entre dois ministros do Supremo mostra exatamente que tem alguma coisa errada e algo precisa ser implementado para a correção de rumos, visto que a imagem da Corte foi extremamente arranhada nas expressões se seus próprios integrantes, o que demonstra desvio de conduto por parte de quem precisa dar exemplo de correção, acerto, justiça e dignidade, por se tratar da instituição responsável pela melhor interpretação da Constituição e pela defesa da boa e regular alicação do ordenamento jurídico do país, de modo que é fundamental que seus integrantes se portem sob os princípios da lisura, do decoro e dos ditames constitucionais, com embargo dos questionamentos que têm aflorados com muita frequência nos últimos tempos, como esses que acabam de vir à tona, para suscitar exatamente a necessidade de reflexão sobre a forma correta de atuação dos ministros  do Supremo, que têm a obrigação de ser modelo de correção e dignidade, na vida pública.
O duelo entre dois ministros do Supremo mostra o verdadeiro estado de ânimo existente entre integrantes da Corte, onde ficou muito claro o sentimento de adversidade e de intolerância entre eles, mostrando que o ambiente não é dos melhores no plenário, diante da agressividade em que cada qual disse o que sente um sobre o outro e vice-versa, em palavras duras e contundentes, ficando a impressão de que ninguém está satisfeito nem se conforma com o desempenho deles, em termos do atendimento do interesse público, que é a finalidade precípua daquela Corte.
Na verdade, essa forma de comportamento de ministros evidencia extremo desrespeito à dignidade que precisa ser demonstrada não somente em plenário, mas sobretudo no âmbito do Supremo, à vista da relevância dos cargos por eles ocupados, que não podem ser confundidos com funções de somenos importância da República.
A propósito, as acusações são gravíssimas a mostrarem, em princípio, as fragilidades ínsitas deles, que não condizem com a dignidade do cargo, notadamente no caso de favorecimento de criminosos e, em especial, no questionamento sobre as decisões adotadas por ministro, dando a entender que eles foram tomadas sob encomenda e de acordo com a aproximação com os interessados, o que demonstra o nível a que se transformou a lamentável discussão, que somente contribui para acentuar a divisão e o distanciamento entre ministros da Excelsa Corte de Justiça, que certamente funcionaria com melhor aproveitamento para o interesse público se eles se comportassem pelo menos em harmonia com os princípios de civilidade e respeito mútuo.
Diante da dureza das palavras, consideradas precisas e acertadas por muitas pessoas, houve quem dissesse que um dos ministros teve como reação o sorriso amarelo diante da verdade que foi mostrada com a coragem do necessário enfrentamento, que até pode contribuir para mostrar que ninguém tem o direito de se colocar acima de absolutamente nada.
É induvidoso que o bate-boca não devia fazer parte do figurino de excelência que se espera da Excelsa Corte de Justiça do país, mas diplomacia e educação à parte, até que certos ministros precisam ouvir algumas verdades sobre as suas injustificáveis e indevidas arrogância, petulância, prepotência, hipocrisia e onipotência, principalmente para mostrar a eles que a importância da instituição depende exclusivamente da competência e da eficiência resultantes do desempenho de cada ministro, tão somente no exato cumprimento da missão institucional daquela Corte, na defesa das melhores interpretação e aplicação do ordenamento jurídico do país. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 27 de outubro de 2017

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