terça-feira, 24 de outubro de 2017

Sentimento oportunista

A defesa da ex-presidente da República petista impetrou ação no Supremo Tribunal Federal pedindo a anulação do processo de impeachment sofrido por ela, que ainda não foi julgado por essa Corte, tendo arrolado como principal argumento conteúdo da delação premiada do operador financeiro do PMDB, que se encontra preso.
Em vídeo divulgado pelo jornal Folha de S. Paulo, o mencionado operador teria afirmado que repassou o valor de R$ 1 milhão para o ex-deputado e ex-presidente da Câmara dos Deputados, para a "compra" de votos a favor do impeachment da petista, em atendimento à mensagem recebida dele, dias antes da votação no plenário, onde havia solicitação dos valores, para aquela finalidade.
O operador disse, em depoimento ao Ministério Público, que "Ele (o então residente da Câmara) me pergunta se eu tinha disponibilidade de dinheiro, que ele pudesse ter algum recurso disponível para comprar algum voto ali favorável ao impeachment da Dilma. E eu falei que ele podia contar com até R$ 1 milhão e que eu liquidaria isso para ele em duas semanas no máximo".
O advogado da ex-presidente afirmou que, com a delação premiada do operador, "ficou demonstrado que o ex-deputado Eduardo Cunha comprou votos de parlamentares em favor do impeachment. Entendemos que na defesa da Constituição e do Estado Democrático de direito, o Poder Judiciário não poderá deixar de se pronunciar a respeito, determinando a anulação do impeachment de Dilma Rousseff, por notório desvio de poder e pela ausência de qualquer prova de que tenha praticado crimes de responsabilidade".
O advogado disse ainda que o impeachment aconteceu em razão de decisões ilegais e imorais tomadas pelo então ex-presidente da Câmara e por todos os parlamentares que queriam evitar "a sangria da classe política brasileira".
Causa enorme perplexidade a ex-presidente afastada acreditar piamente, agora, em delação premiada, quando, antes disso, os petistas diziam que delatores eram pessoas que falavam qualquer coisa para se beneficiar da diminuição de penas e, segundo ela, "delação sem prova não vale nada", evidentemente em se tratando de acusação contra o PT e seus integrantes, onde as delações não tinham o menor valor jurídico, porque seus autores queriam mesmo era se safar de punição.
Nessa mesma linha de delação, os empresários da JBS disseram ao Ministério Público, conforme gravação publicada na mídia, que um político simpatizante da petista pediu dinheiro a eles para comprar votos contra o impeachment, mas esse fato, altamente degradante e prejudicial aos interesses dela, possivelmente não deve ter sido constado da ação em causa, justamente porque não interessa ao deslinde da demanda, mas, em termos jurídicos, têm a mesma validade, apenas em sentido oposto.
O moral da história se resume em algo ridícula e injusto, porque a ex-presidente se agarra em argumento que antes condenava, mesmo sem prova, que somente pode ter validade quando se encaixa nas suas conveniências políticas, o qual, em outras circunstâncias, já foi considerado absolutamente desprezível em relação aos demais casos relacionados com o próprio partido e isso mostra a falta de dignidade e de incoerência dos políticos tupiniquins, pelo visível ânimo de oportunistas.
É muito triste que haja tamanha e explícita parcialidade, a demonstrar que o homem público é capaz de atropelar os sentimentos da razoabilidade e do bom senso, na tentativa de conseguir o reconhecimento de algo sob argumentos que nem acredita, como a delação que era julgada sem validade quando desacompanhada de provas, mas, de repente, ela passa a ter vida para amparar interesse pessoal.
A propósito, enquanto o ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil dos governos petistas se manteve com a boca fechada, era considerado o gênio e o homem mais inteligente do PT, mas, só foi ele dá com a boca nos dentes, imediatamente se tornou, para o PT, criminoso, mentiroso, incompetente e sem caráter, eis o verdadeiro sentimento da delação premiada para esse partido.
Em princípio, à vista da finalidade precípua da delação premiada, imagina-se que todas as delações sejam verdadeiras, considerando que ninguém vai ter coragem de dizer algo que não possa provar, porque não faria sentido se fazer acusação sobre algo, desprovida de prova e também sem o usufruto do benefício, uma vez que este é a razão principal da colaboração à Justiça, mas como é da índole petista nenhuma delação é verdadeira quando ela acusa seu partido, que é fonte de pureza e virtude, tudo não passando de invencionice inaceitável, mas a regra passa a ter exceção, ante o fator conveniência, como mostra a demanda em apreço.
Convém que os brasileiros fiquem atentos aos políticos que não têm o menor pudor em agir, na vida pública, por puro sentimento oportunista, ao considerar válido, em termos jurídicos, algo que antes era desprezível, somente porque agora ele se presta ao benefício de suas causas políticas. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 24 de outubro de 2017

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