O
presidente da República afirmou, há três
dias, que “não há nada comprovado cientificamente sobre essa vacina aí”,
em referência à CoronaVac, vacina contra a Covid-19, que teve a aprovação, para
uso emergencial, pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
O
presidente disse a jornalistas que "Eu não posso obrigar ninguém a
tomar vacina, como um governador um tempo atrás falou que ia obrigar. Eu não
sou inconsequente a esse ponto. Ela tem que ser voluntária, afinal de contas,
não está nada comprovado cientificamente com essa vacina aí. Peço que o pessoal leia os contratos com as empresas para tomar pé de
onde chegaram as pesquisas e porque não se concluiu ainda dizendo que é uma
vacina perfeitamente eficaz. Pelo que tudo indica segundo a Anvisa, ela vai
ajudar a que casos graves não ocorram no Brasil a quem for vacinado.”.
À
toda evidência, o presidente do país deixa muito claro que ignora estudos conduzidos
e acompanhados por muitos cientistas, durante a pandemia, culminando com o pronunciamento
favorável da Anvisa, órgão que aprovou e autorizou apenas vacinas que têm a
eficácia e a segurança necessárias para a aplicação em caráter emergencial.
Interpretando-se
literalmente, a declaração do presidente é irreal e sem base senão em conclusões
pessoais, ficando ainda mais estranha a situação porque ele simplesmente ignora
a decisão dos profissionais e especialistas responsáveis pela aprovação dos
produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária, por incumbência legal.
A
propósito, convém ser lembrado que o uso emergencial das vacinas CoronaVac e da
Universidade de Oxford e da farmacêutica AstraZeneca foi aprovado, por unanimidade,
pela Anvisa, que é a principal agência reguladora do Brasil, em matéria de medicamentos,
inclusive quanto à vacina.
É
curioso que, durante as declarações, o presidente repetiu, como tem feito ultimamente,
que a imunização não será obrigatória, mas, na mesma ocasião, ele contrariou a sua
linha de raciocínio anterior, ao ter afirmado que, se a “vacina passou pela
Anvisa”, ele não teria “mais o que discutir”.
Vejam
só o contrassenso do presidente, quando ele afirmou que "O pessoal
dizia que eu era contra a vacina. Eu era contra a vacina sem passar pela
Anvisa. Passou pela Anvisa, eu não tenho mais o que discutir, eu tenho que
distribuir a vacina".
O
presidente teria sim o dever institucional de não mais discutir a eficácia da
vacina e distribuí-la para a imunização, mas também ser coerente no sentido de
que o processo pertinente merece os melhores estímulos, para que a população seja
motivada a se vacinar.
Ao
contrário disso, as declarações acima funcionam mais como antídoto da salutar mobilização
pretendida, posto que a terrível dúvida presidencial, afirmando que “não há
nada comprovado cientificamente sobre essa vacina aí”, não poderia ter nada
mais estarrecedora, porque a declaração foi pronunciada pela principal autoridade
do país, responsável pela grandeza da imunização com o emprego de produto que
ele demonstra não confiar, em que pese a sua aprovação pela agência da maior competência
do país.
No
ato de aprovação das vacinas, uma diretora da Anvisa, que era a relatora do
pedido de uso emergencial, declarou que “Ambas as vacinas atendiam os
critérios de qualidade e segurança para uso emergencial".
A
eficácia e a segurança da CoronaVac, que está sendo aplicada no programa de
imunização, foram comprovadas em ensaios clínicos monitorados no Brasil, cujo
produto vem sendo fabricado pelo Instituto Butantan, em São Paulo, instituição
pública de pesquisa ligada ao governo do estado, em parceria com a farmacêutica
chinesa SinoVac, somente caberia questionamento por parte de quem não acredita
na ciência, como vem evidenciando desde o início da pandemia, por meio de atos
robustos e indelicadas suspeitas, como neste acima, no lançamento de tamanha
dúvida sobre a eficácia da vacina, quando tudo já se encontra pacificado no
meio científico, com o beneplácito da Anvisa.
Nessa
mesma linha de credibilidade da vacina, os estudos pertinentes foram publicados
na revista científica The Lancet, que mostram que duas vacinas aprovadas
pela Anvisa são seguras e têm capacidade para gerar resposta do sistema de
defesa.
Em
conclusão, os cientistas declararam que, nos estudos, não foram registrados
efeitos adversos graves em nenhuma das duas vacinas, havendo efeitos mais comuns
verificados apenas na dor no local da injeção e na febre e dor de cabeça de
intensidade leve ou moderada.
Por
fim, houve o registro segundo o qual a eficácia de uma vacina mostra como ela
funciona sob condições ideais, mesmo ela tendo a eficácia de 50%, por exemplo, fato
este que significa que o imunizante conseguiu reduzir em 50% o número de casos
de doença que ocorreriam se ele não tivesse sido aplicado.
Não
há a menor dúvida de que o presidente do país jamais deveria, logo agora, em pleno processo
de imunização, ter levantado questionamento sobre a eficácia da vacina, diante
da absoluta falta provas e ainda pelo fato de que sua validade para o fim
preconizado foi objeto de confirmação pela Anvisa, que tem a palavra oficial sobre
o assunto, não cabendo a ninguém mais suspeitar sobre algo nesse sentido, salvo
em caso do surgimento de elementos que contrariem o resultado dos exames sob a
incumbência do órgão especializado, o que não houve.
Essa
forma de comportamento do presidente só confirma o desequilíbrio pensamento de
autoridade que se satisfaz quando se encontra no meio de jornalistas e tem
oportunidade para fazer declarações comprometedoras como a que ele fez anteontem,
que desdizem outras feitas anteriormente, no sentido de que, se a Anvisa
decretou, “eu não tenho mais o que discutir. Eu tenho que distribuir a
vacina" e pronto, mas a sua brilhante índole de contradição nunca se
satisfaz, como nesse caso, apesar de já se encontrava resolvido, mas ele volta
às páginas dos jornais, justamente porque o presidente adora criar polêmica e
das grandes, porque o assunto afeta as estruturas da ciência, ou seja, a
eficácia da vacina já legalizada por quem de direito.
É
evidente que qualquer autoridade pública pode sim questionar até mesmo a
eficácia de vacina, depois da aprovação pelo órgão competente, mas isso precisa
ser feito com a máxima cautela possível, como, por exemplo, tendo por base
alguma prova que possa suscitar a invalidação de atos já sacramentados, ao menos,
nalguma fase dos estudos que serviram de fundamento para a certificação sobre a
eficácia do produto.
Sem
qualquer justificativa plausível, como fez o presidente, a sua declaração se caracteriza
como totalmente despropositada e contrária ao interesse público, diante da
tentativa de incitar a população a desacreditar da eficácia da vacina, quando
ele sugeriu que as pessoas leiam os contratos das empresas para descobrirem a
validade das pesquisas.
Ao
fazer as declarações em apreço, na forma transcrita acima, o presidente do país
perde muita credibilidade, por ter, antes, concordado com o competente trabalho
promovido pela Anvisa, quando logo depois do momento da certificação das vacinas,
mas a sua mudança de ideia, sem qualquer motivação nem fato superveniente sobre
o tema, demonstra desconfiança sobre a eficácia delas e ainda aconselha que a
população o acompanhe nessa injustificável medida.
Nada
impede que o presidente do país tenha insegurança quanto à eficácia da vacina,
mas, por se tratar de assunto que envolve o interesse público, o bom senso e a
razoabilidade aconselham que a dúvida de que se trata deveria ficar somente com
ele, para não atrapalhar o processo de imunização, que já começou com bastante
atraso e em evidente prejuízo dos brasileiros, que perderam muito tempo para se
proteger contra a Covid-19, por culpa da desorganização dos órgãos incumbidos
da saúde pública.
Urge
que o presidente da República se conscientize, em atenção à relevância e à
responsabilidade administrativas do cargo que ocupa, sobre a conveniência de serem
sopesados, sob o princípio da prudência, os temas objeto das entrevistas com a
imprensa, de modo a se evitar polêmica em torno de assunto já definido, em especial
como nesse caso das vacinas, que já se encontra definido e pacificado, em
termos da ciência, quando a sua rediscussão somente contribui para prejudicar o
interesse público.
Brasília, em 24 de janeiro
de 2021
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