No
Estado Democrático de Direito, é bem aceitável, por normal, que parlamentares,
políticos e sociedade se expressem e se posicionem publicamente sobre a sua visão
em relação à preferência a candidatos à Presidência da República ou sobre os
demais assuntos de interesse da vida pública, porque isso é importante para o
aperfeiçoamento da democracia.
Em
casos idênticos, não se compreende que seja normal que membro do poder
Judiciário, no caso, ministro do Supremo Tribunal Federal, possa se autointitular
legitimado para criticar possível reeleição do presidente do Brasil, em
conferência internacional, o qualificando como seu “inimigo”, como se ambos
estivessem no mesmo cenário político, quando ele nem político é.
Uma
deputada brasileira participante do debate afirmou que “não é óbvio que a
gente já derrotou Bolsonaro”, tendo dado como certo o aumento da violência
politicamente motivada tanto em caso de vitória quanto de derrota do presidente,
no próximo pleito eleitoral.
Diante
da resposta de outro participante do evento, em uníssono com a parlamentar, o referido
ministro, em alto e bom som, disse que “é preciso não supervalorizar os
inimigos. Nós somos muito poderosos. Nós somos a democracia. Nós é que somos os
poderes do bem”, ficando subentendido que ele se referia ao presidente
brasileiro, uma vez que o assunto era indissociável do contexto da pergunta.
Em
análise fria, a participação desse ministro conspira contra os princípios da imparcialidade
e da credibilidade da principal corte da Justiça brasileira, porque declara,
com muita clareza, que faz parte de corpo de agentes políticos naquela casa, mostrando
a sua posição bastante definida e afinada com as forças que trabalham para a
derrota do presidente do país.
Essa
atitude é bastante preocupante, em razão da criação de conflito de interesses
justamente por parte de onde a postura de seus membros deve ser sempre de
imparcialidade, neutralidade e equidistância à disputa eleitoral, em se tratando
de questões políticas relevantes do país, como assim precisam proceder todos os
juízes, à vista da imperiosidade ínsita da autonomia da competência da magistratura.
Seria
desnecessário o ministro afirmar, mas ele não se ruborizou em declarar que o
Supremo é “muito poderoso”, como vem sendo em muitas situações, na forma
de atos e decisões que suscitam questionamentos por parte de especialistas em
assuntos judiciais, à vista das atribuições originais, de natureza jurisdicional
e constitucional, atribuídas àquela corte.
Muitos
foram os acontecimentos recentes que contaram com o envolvimento do Supremo, em
especial, a sua contribuição para a destruição da competente Operação Lava-Jato;
a abertura de inquéritos denominados “fim mundo”; a anulação de sentenças
judiciais consolidadas, sem razões plausíveis, quando elas já tinham sido confirmadas
em instâncias superiores da Justiça; além dos poderosos inquéritos compreendendo
as investigações de casos relacionados com as fakes news e os dos “atos antidemocráticos”,
entre outros assuntos estranhos à sua competência constitucional da corte.
Tudo
isso ficou muito evidenciado de que aquela corte atua muito além dos limites
impostos pela Constituição Federal, de leis, da própria jurisprudência, dos
bons e seguros princípios jurídicos e até da realidade dos fatos, conforme a
existência de inúmeros questionamentos feitos pelas opiniões especializada e pública.
A
tal absurda situação protagonizada pelo Supremo realmente expõe a força desequilíbrio
do seu poder decisório, que vem agindo na contramão do aperfeiçoamento dos
princípios republicano e democrático, à vista de resultados que dizem apenas
com os interesses de seus integrantes, em desprezo do rigor da sua competência
jurisdicionada pela Constituição.
Em
muitos casos, a atuação das cortes superiores brasileiras tem contribuído, de
forma decisiva, para verdadeiro escurecimento da liberdade de expressão no
Brasil e para a relativização de várias liberdades democráticas, à vista de
muitas decisões questionáveis, quanto ao respeito à constitucionalidade dos atos
pertinentes.
Exemplo
disso vem de ato de outro ministro do Supremo, que acho por bem afirmar que aquela
corte era o “editor de uma nação inteira” e exercia o “poder
moderador”, em clara declaração de que, na prática, há verdadeiro processo
de usurpação das funções originárias e privativas estabelecidas pela Constituição,
quando nela não há menção alguma sobre atribuição referente ao poder moderador,
mas sim, que já é muito, o poder de fiscalizar a correta aplicação do texto
constitucional, quanto aos seus princípios fundamentais, como forma de se
assegurar a segurança jurídica no país.
Os
fatos mostram muitas decisões que contribuem para o comprometimento da seriedade e da credibilidade
do trabalho que compete ao Supremo, quando elas e seus integrantes se declaram também
agentes políticos e ainda se posicionando em lado bem definido, em dissonância com
a normal postura de imparcialidade que se espera da Justiça e de seus juízes.
Fica
clara nisso a deliberada negação da boa e segura prática jurídica, na qual o magistrado
somente deve se pronunciar, por dever ético-funcional, em atenção à dignificação
da magistratura, apenas nos processos sob o seu comando e ainda atendo-se ao
seu conteúdo.
A
verdade é que, da maneira como muitos ministros se mostram em público, como
estrelas mediáticas, desejosos de se manterem em evidência na imprensa, como
autoridade máxima da República, eles terminam comprometendo as suas
independência e idoneidade, em claro ferimento à ética funcional prevista na
Lei Orgânica da Magistratura, que deveria prevê também sanção para casos que
tais, como forma de controle e disciplinamento de postura funcional.
Compreende-se
perfeitamente que os ministros do Supremo têm sim direito de opinar como
cidadão, mas apenas com a discrição inerente à manutenção da integridade
funcional, de modo a não se permitir a emissão de juízo de valor sobre política
ou outros casos estranhos ao exercício do seu cargo, tendo como pressuposto que
essa atitude tem o condão de reforçar a integridade da sua autoridade funcional
e moral como integrante da principal corte da Justiça do país.
Sem
sombra de dúvida, quando o ministro decide opinar e se posicionar, com o peso
do seu cargo, sobre assuntos de natureza político/partidária, na forma de palavras
ou por ações, isso tem significado enorme desgaste moral da autoridade tanto da
corte como de seu integrante, porque essa não é a sua função constitucional, constituindo
indevida interferência de poder.
Enfim,
os brasileiros esperam que os ministros do Supremo Tribunal Federal se conscientizem
de que as suas atividades funcionais são se extrema importância para os
interesses nacionais, de modo que elas permaneçam em estrita sintonia com os princípios
ético-funcionais inerentes ao exercício do cargo, nos exatos termos disciplinados
pela Lei da Magistratura Nacional, em consonância com os consagrados conceitos
da imparcialidade e do respeito à originalidade institucional da magistratura.
Brasília,
em 28 de junho de 2022
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