sábado, 3 de setembro de 2022

Inocência?

 

O principal candidato da esquerda à Presidência da República decidiu  adotar estratégia para tratar do tema que vem incomodando bastante seus planos políticos, qual seja, a corrupção, que foi a cara do seu governo, à vista dos fatos alvo do mensalão e do petrolão.

Em entrevista a uma rádio, o político falou abertamente sobre as denúncias envolvendo a família do presidente da República, seu principal concorrente na corrida presidencial, e intensificou as críticas à operação Lava-Jato.

Ele disse que “Temos um presidente que sequer investigou a investigação do Queiroz, que sequer investigou a investigação de seus filhos, que sequer investigou as denúncias contra Pazuello. Nós temos um presidente que não apenas coloca a sujeira embaixo do tapete como transforma em sigilo de 100 anos tudo e qualquer denúncia contra eles (sic).”.

Nas últimas semanas, o político abordou o tema apenas citando as medidas de combate a corrupção feitas durante os governos petistas e tentando se contrapor ao presidente do país, ao afirmar que no seu governo as instituições tinham autonomia para investigar denúncias, o que até pode ter sido verdade, mas elas não evitarem a disseminação de desvios de recursos públicos, na forma dos esquemas do mensalão e do petrolão.

O político também atacou de forma mais incisiva a Operação Lava-Jato, dizendo que, contra ele, “foi levantado a maior calúnia da história do Brasil, possivelmente muito maior da que levou Getúlio Vargas a morte (sic)”, que pode até ser verdade, mas ele não conseguiu demovê-las, em se tratando de meras injúrias, que poderiam ser removidas facilmente, por meio de comprovação da verdade, com a apresentação de contraprovas juridicamente válidas.

O político também criticou o ex-juiz da Lava-Jato e o coordenador da força-tarefa, dizendo que a “A única justiça federal que me condenou foi a do Moro, a pedido do Dallagnol, porque havia interesse político de não permitir que eu fosse candidato em 2018. A impressa brasileira deveria reconhecer que foi enganada durante 5 anos por um juiz mentiroso e por um procurador que criou uma quadrilha de procuradores.”, assertiva essa que não condiz com a verdade, porque as sentenças condenatórias à prisão dele foram convalidadas pelas segunda e terceira instância, respectivamente por três desembargadores e cinco ministros, que as chancelaram por unanimidade.

O político ainda enfatizou o fato de que os processos penais contra ele foram anulados, dizendo ser “um cidadão inocente”, ao afirmar que “Eu sou o único cara condenado por ser inocente. É proibido eu ser inocente. Porque, com todas as decisões favoráveis a mim, ainda tem gente que fala ‘mas você não foi inocentado’. Então, eu sou um cara condenado por ser inocente.”, o que também não é verdade que os processos dele tenha sido anulados, porque eles foram apenas transferidos de jurisdição, ao tempo em que somente as sentenças condenatórias à prisão dele foram anuladas, sem exame de mérito das ações penais.

Ou seja, o político foi considerado culpado pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro e condenado à prisão, por doze anos e meio, em face de ter se beneficiado de propinas com recursos oriundos da Petrobras, mas o Supremo Tribunal Federal, sem qualquer exame de mérito, anulou as sentenças pertinentes, por entender que a jurisdição de Curitiba não podia julgá-lo, determinando que os processos fossem enviados para Brasília, para novo julgamento, ficando claro que essa decisão manteve os objetos dos crimes intatos.

Hoje, o político menciona, sem respaldo algum, o fim das condenações como prova da sua inocência, sem que ele tenha conseguido refutar nem afastar a imputação sobre a autoria dos fatos irregulares cuja autoria é atribuída a ele e, quanto a eles, aguarda-se novo julgamento, o que vale dizer que ele continua implicado com a Justiça, enquanto ele não for novamente julgado pelos crimes referentes às denúncia ainda existentes nos autos.

De forma extremamente equivocada, o político disse que "Eu tinha certeza que esse dia chegaria. Esse dia chegou com o voto do Fachin, de reconhecer que nunca teve crime cometido por mim, de reconhecer que nunca teve envolvimento meu com a Petrobras. E todas as amarguras que eu passei, todo o sofrimento que eu passei, acabou", quando a determinação do ministro do Supremo  foi apenas no sentido de que os processos julgados em Curitiba fossem anulados e julgados por outro juiz, em Brasília, cuja decisão foi confirmada pela Segunda Turma do Supremo, mas jamais houve decisão de se “reconhecer que nunca teve crime cometido por mim”.

Á toda evidência, as sentenças foram anuladas por razões técnicas, embora sem base legal alguma, e tanto isso é verdade que o próprio Supremo já havia negado, por quatro vezes, o mesmo pedido nesse sentido, o que mostra o absurda dessa decisão, que, em absoluto, nada prova a inocência do político, mesmo porque não houve rejulgamento sobre o mérito das ações penais objeto das condenações à prisão dele.

Convém frisar que o Supremo anulou as sentenças e não os processos, e esse fato é aproveitado pelo político, de forma equivocada e esperta, para dizer que ele é inocente, o que não é verdade, uma vez que os mesmos assuntos vão ser julgados novamente, o que significa dizer que ele não é inocente, porque se fosse não haveria necessidade de novo julgamento.

Ele é tão culpado que os seus crimes por corrupção passiva e lavagem de dinheiro foram julgados e por três instâncias, a primeira, a segunda e a terceira, com juízes independentes, mais os ministérios públicos que atuavam perante essas instâncias, também de modo independente, cujas sentenças foram pela unanimidade, em razão do entendimento sobre a substancial materialidade da autoria dos atos delituosos atribuída a ele, conforme as fortes provas, não só de corrupção passiva, mas também de lavagem de dinheiro.

Ou seja, o Supremo não inocentou o político, precisamente porque não houve nessa corte o exame de mérito dos processos, mas sim apenas o reconhecimento que ele deveria ter sido julgado em outra instância da Justiça, tendo ficado assente que se tratava de mera formalidade processual, sem se adentrar no mérito das causas em si, o que é bem diferente do que ele alega que é inocente, porque os atos ilícitos em si. praticados por ele, pelo menos aqueles objeto dos julgamentos já realizados, permanecem válidos, o que significa dizer que ele deve prestação de contas à sociedade e à Justiça sobre seus atos, na vida pública.

À toda evidência, a Justiça brasileira não decretou a absolvição do político, o que vale se afirmar que a culpa que havia sido comprovada nos autos já julgados permanece integralmente, quanto aos atos ali indicados, exatamente porque ele foi incapaz de demovê-la dos autos.

O mais importante de toda essa história é que o próprio político reconhece que houve corrupção no governo dele, porque, segundo ele, as pessoas testemunharam e deletaram à Justiça, foto este que não teria como ser negado, em face da devolução aos cofres da Petrobras de mais de seis milhões de reais.

Agora, é muito estranho que o político invoque a condição de inocente, quando não há elementos plausíveis capazes para a sustentação dessa assertiva, o que vale dizer que seria muito mais justo que ele procurasse prestar contas à sociedade e à Justiça sobre os atos dele, na vida pública, porque é exatamente assim que procedem os verdadeiros homens públicos, sem necessidade da exploração de artifícios frágeis para o caso, em termos jurídicos, quanto à alegação de inexiste inocência.

À luz dos fatos e da verdade histórica, nada impede que o político se considere indevidamente inocente, porque ele bem sabe do que efetivamente aconteceu de maléfico contra os interesses do Brasil, desde que os brasileiros de verdade estejam cônscios sobre a real situação dos casos nebulosos, como, em especial, os escândalos do mensalão e do petrolão, que o envolvem e pendem de esclarecimentos e justificativas por parte dele, uma vez que as questionáveis irregularidades aconteceram no governo dele.

A questão da moralidade é algo da maior importância, no Estado Democrático de Direito, porque ela não se impõe, no grito nem na marra, mas, sim, a sua conquista se obtém com a natural observância dos princípios de conduta, em especial, na gestão pública.

No caso do político, ele tem todo direito de se considerar inocente e até de dizer que é caluniado, como ele afirma acima, mas, ele como homem público, não pode desprezar, como faz, de forma proposital, os processos referentes às graves denúncias contra ele, que estão aguardando julgamento na Justiça, os quais são aqueles objeto da decisão do Supremo que anulou as sentenças das prisões dele e, ato contínuo, determinou o envio deles para a Justiça de Brasília, para o fim de serem julgados novamente e somente se julga algo se houver matéria para tanto pendente, que é o caso desses processos.

Por consequência desses fatos, juridicamente falando, somente faz sentido se falar em inocência ou mais propriamente absolvição quando aqueles processos forem julgados, de modo que o político possa ter veredicto favorável e assim puder dizer que realmente ele está imune aos fatos criminosos objeto das denúncias suspeitas de irregularidades.

O certo é que não fica bem para o político dizer que  é “condenado por ser inocente”, uma vez que, a bem da verdade, existem, na Justiça e isso ele não pode ignorar, processos penais referentes às denúncias sobre suspeitas de prática de irregularidades, que pendem de julgamento.      

Ante todo o exposto, convém que os brasileiros honrados e dignos se conscientizem de que o Brasil precisa ser presidido por quem preencher os requisitos de conduta ilibada e idoneidade, na vida pública, de modo que sejam observados os salutares princípios republicano e democrático, aproveitando para a eliminação das atividades políticas quem mente e seja indigno para provar a sua inocência junto aos tribunais, como fazem normalmente os verdadeiros e honrados homens públicos.

          Brasília, em 3 de setembro de 2022

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