segunda-feira, 4 de julho de 2022

O Brasil sem leis?

 

O presidente da República voltou a atacar a cúpula do Judiciário, especialmente ministros do Supremo Tribunal Federal, por ele nominados, tendo afirmado que não há mais lei, no Brasil, por parte dessa corte.

Em entrevista ao canal de uma jornalista, o presidente do país reiterou, sem contestação, uma série de alegações notoriamente inverídicas sobre o sistema eleitoral brasileiro, a exemplo de que a eleição não é auditável e a totalização dos votos é feita em "sala secreta", além de acusar o presidente do Tribunal Superior Eleitoral e outros dois ministros do Supremo de terem o líder da oposição brasileira como candidato na próxima eleição presidencial.

O presidente acusou as referidas autoridades, dizendo que "Há muito tempo eles estão fora das quatro linhas" e que "Não existe mais lei aqui no Brasil por parte do Supremo Tribunal Federal. Não existe. É uma obsessão para tentar me tirar daqui, ou me tornar inelegível, ou fazer com que eu perca as eleições".

O presidente do país afirmou que "O Lula é o candidato desses três. Não tenho dúvida disso. O Lula é o candidato do Fachin, do Barroso e do Alexandre de Moraes. Eles não fazem nada no outro lado, só do meu lado. Isso é claríssimo o que está acontecendo", cujas alegações são destituídas das necessárias fundamentações sobre evidências, precisamente por falta de provas, que são a essência para a consistências das afirmações produzidas sobre algo.

O presidente do país também voltou a dizer que o presidente do TSE foi responsável por tirar o principal político da oposição da prisão e torná-lo elegível, ao decidir anular as condenações dele, na Lava Jato, o que é fato verídico, que, estranhamente, não houve recurso de parte alguma, nem mesmo do Ministério Público Federal, para a contestação de gigantesca excrescência jurídica, em demonstração de cristalino abuso de poder que não se admitiria nem mesmo nas piores republiquetas.

A verdade é que o referido político foi solto da prisão logo após o plenário do Supremo mudar o entendimento sobre a prisão em segunda instância, e não por meio de decisão de ministro, de forma isolada, conquanto a anulação das condenações do político foi confirmada pelo plenário do Supremo, materializando a mais estarrecedora decisão sobre escândalo de roubalheira da história da República brasileira.

O presidente do país sentenciou "Que querem impedir (minha candidatura à reeleição) não há dúvida. Vão conseguir? Eu acho que vão fazer tumulto, eles podem até lá cassar meu registro, alguns dias depois o pleno, por exemplo, desfaz, mas fica aquela imagem para o Brasil todo", repita-se, sem apresentar provas de absolutamente nada, .

A verdade é que o presidente brasileiro acusa ministros do Supremo de quererem tumultuar o processo eleitoral, além de atacar, de forma reiterada, sem haver nenhuma evidência acerca de provas quanto possíveis fraudes, sem querer dizer que elas inexistem, de modo que tudo não passa de tentativa de colocar sob suspeita a confiabilidade das urnas eletrônicas, porque isso não é certo, diante da certeza de que nada se ganha na base do grito nem da ameaça.

À toda evidência, não fica nada bem, em termos de efetividade de esforço, para o presidente da República se dedicar, com unhas e dentes, a tema visivelmente fora de propósito para a finalidade republicana, que deve a essencialidade do seu mandato, em cumprir, de forma altruística, as funções exclusivamente relacionadas com as atribuições oficiais e  presidenciais.

Essa tarefa de acusações sem provas do que diz e acusa, a todo instante, só demonstra desespero sem causa mínima, denotando tentativa de complô contra os seus projetos políticos sobre a sua reeleição, mesmo que em algum caso possa ter fundo de verdade, mas qualquer suspeita nesse sentido perde credibilidade sem nenhuma fundo de evidência, porque a simples ilação somente tem o condão de confirmar a perda de tempo e a inutilidade de tanto esforço que poderia ser dedicado aos ingentes e importantes assuntos inerentes ao mandato presidencial.

É inacreditável como o presidente do país não atente nem perceba o tanto da insensatez ao dedicar importante tempo do cargo somente cuidando de acusar desnecessariamente fatos inexistentes, mesmo que as suspeitas possam se confirmar em outro momento.

O certo mesmo é que, por enquanto, não existe absolutamente nada em que se preocupar, uma vez que as meras suspeitas só existem no imaginário do presidente do país e isso conspira contra a própria insensatez de não conseguir vislumbrar o gravíssimo erro da sua permanência em círculo falando as mesmas asneiras, porque as inócuas acusações não resolvem coisa alguma, em especial porque nada disso vai impedir que ministros do Supremo mudem o roteiro real destinado a ajudar e apoiar o candidato escolhido por eles.

Ou seja, o presidente do país se expõe ridiculamente, ao fazer acusações que não consegue provar o que diz, deixa de resolver importantes questões administrativas, na construção de algo que poderia contribuir beneficamente em prol da sua reeleição, e ainda promove a autoridade de ministros do Supremo, que se sentem honrados em serem acusados de algo que sentem prazer em fazer, que é apoiar, até com muito sucesso, o candidato deles.

Por fim, não tem a menor legitimidade o presidente da República afirmar, de forma generalizada, que “não há mais lei, no Brasil, por parte dessa corte”, somente porque ele entende que alguns ministros descumprem princípios constitucionais, caso em que os demais ou alguns outros magistrados possam agir diferentemente deles, cumprindo fielmente os ditames constitucionais, fato que não tem o menor cabimento a generalização.

Convém que o presidente brasileiro prime pela defesa da dignidade do seu importante cargo, atentando para o devido zelo no seu desempenho, no sentido, em especial, de que qualquer questão que possa significar interferência no exercício dele, seja tratada por meio das vias oficiais, com a interposição dos recursos inerentes a ela, sem necessidade, em absoluto, de qualquer acusação ou críticas a quem quer que seja nem suspeita que não possa ser resolvida exclusivamente pela via da tolerância, da diplomacia e do entendimento republicano, na melhor forma recomendada pelos salutares princípios da civilidade e da cidadania.

Urge que o presidente da República se consciente sobre a necessidade da estrita dedicação aos trabalhos inerentes às funções do relevante cargo que ele imagina que ocupa, deixando as questões relacionadas com a sua reeleição para serem discutidas precisamente no período apropriado para a campanha eleitoral, na forma da legislação de regência, como assim é racionalmente observado nos países evoluídos, em termos políticos e democráticos.   

Brasília, em 2 de julho de 2022

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