sábado, 9 de julho de 2022

Vulnerabilidade das urnas?

 

Circula nas redes sociais vídeo em que o ministro da Defesa discursa na Câmara dos Deputados, mostrando o seu empenho em tentar contribuir com o aperfeiçoamento do sistema eleitoral brasileiro, mas deixa muito claro que não tem sido muito fácil sequer se reunir com a cúpula dos técnicos do Tribunal Superior Eleitoral, que resiste em aceitar as sugestões formuladas pelas Forças Armadas.

O esforço do general chega a ser patético, ao tentar mostrar a precisa insignificância das Forças Armadas no processo eleitoral, com o objetivo de contribuição ao aperfeiçoamento do sistema eleitoral brasileiro.

Mais comovente ainda é a insistência do general em lamentar que o TSE tem se mostrado indiferente às sugestões das Forças Armadas, sob o argumento de que essas instituições foram convidadas para participarem da comissão de transparência, como se isso tivesse o condão de garantir algum privilégio de impor alguma forma de competência para influenciar no aperfeiçoamento operacional das urnas eletrônicas.

Ledo engano, general, porque a competência privativa para modificar esse sistema, na forma constituição, é do TSE, independentemente ou não das sugestões apresentadas por quem quer que seja, por mais competente que elas sejam, porque a Justiça eleitoral sabe perfeitamente, para o bem ou o mal, como quer que o sistema eleitoral precise funcionar, para se ajustar tão somente às suas conveniências, sem precisar prestar contas a ninguém, nem mesmo às Forças Armadas, que não tem competência constitucional para atuar no sistema eleitoral.

Isso se explica a terrível angústia do general, que vai sair na saudade, com as suas sugestões enroladas no pergaminho, porque elas são realmente valiosíssimas para o aperfeiçoamento pretendido por ele e os brasileiros, mas sem a menor valia para o TSE, que já está satisfeito com o sistema eleitoral idealizado aos seus propósitos finalísticos.

Se o general tivesse o mínimo de inteligência gerencial, não precisaria ficar perdendo tempo jogando palavras ao vento, apelando por ser ouvido e insistindo pela aceitação das suas sugestões, que apenas são jogadas ao vácuo, sem nenhum aproveitamento.

Em forma de notícias veiculadas pela mídia, há notícias de que as Forças Armadas e peritos criminais conhecedores de tecnologia da informática constataram gravíssimas falhas no sistema funcional das urnas eletrônicas que realmente incapacitam, por completo, a confiança e segurança do resultado das eleições, conforme a identificação de falhas capitais, como as indicadas a seguir.

Segundo se informa, os peritos constataram a possibilidade de ataque no processo de inicialização das urnas eletrônicas, por meio de fácil raqueamento, que se trata de acesso por terceiros; a viabilidade da geração de boletins falsos de urnas, a se permitir a transferência de votos de candidatos para outros, de modo a se eleger quem o sistema quiser; a obtenção da chave criptográfica das urnas, que é a alma do processo eleitoral, porque ele pode facilitar a transferência de votos de candidatos para outros; a recuperação da ordem digitável do registro do voto, que é o que garante a confiança e a segurança do voto.

Ou seja, se tudo isso que consta acima é verdadeiro, não há a menor dúvida de que são patentes a vulnerabilidade e a incerteza sobre os resultados do processo eleitoral brasileiro, diante da indiscutível possibilidade de manipulação dos votos, por meio de mecanismos controlados diretamente com os recursos sob o gerenciamento direto Tribunal Superior Eleitoral, que não tem interesse algum em aceitar sugestões para o seu saneamento, porque isso afasta o seu poder conferido para o pleno gerenciamento das urnas eletrônicas.

A verdade é que o TSE tem a chave para operalização desse recriminável esquema, mas o mais grave é que nada pode ser feito em sentido contrário, exatamente porque não tem como se provar, por meio de auditoria, que o emprego dos ardilosos instrumentos supramencionados tenha realmente ocorrido no processo eleitoral, exatamente porque eles não deixam rastro, sendo impossível identificá-los com a devida certeza pericial.  

Todo o empenho do general poderia ser benéfico ao sistema eleitoral se as sugestões que ele considera razoáveis fossem transformadas em projeto legislativo, na forma de PEC ou lei, de modo a se estabelecer precisamente a maneira necessária e ideal para o funcionamento das urnas eletrônicas, obrigando que a Justiça eleitoral se submeta precisamente às normas consideradas perfeitas por ele e estabelecidas em normas específicas, no sentido de que as mencionadas fragilidades identificadas pelos peritos da Polícia Federal de Forças Armadas fossem afastadas em definitivo do processo eleitoral, evidentemente com a implantação das medidas sugeridas por esses órgãos, com vistas à confiabilidade e à segurança do processo eleitoral brasileiro.

À toda evidência, isso é exatamente o que fazem os países evoluídos, em termos políticos e democráticos, sem necessidade de oficial general nem ninguém precisarem ficar mendigando às portas da Justiça eleitoral para se reunir com seus poderosos técnicos, ainda que seja para conhecer e discutir algo que, sabidamente, não tem o menor interesse em aceitação por ele, por parte do órgão gerenciador do sistema eleitoral, porque ele demonstra plena satisfatoriedade com os instrumentos existentes sob o seu controle, conforme mostram os fatos.

A verdade é que o intrépido general, consciente ou não, faz papel visivelmente estranho à missão de defesa da pátria e da garantia dos poderes constitucionais, de que trata o art. 142 da Constituição, evidentemente que são atribuições não compreendidas nas importantes sugestões formuladas pelas Forças Armadas, que, embora sejam valiosíssimas contribuições ao sistema eleitoral, não têm a serventia imaginada por elas, ante a preconcepção do Tribunal Superior Eleitoral sobre o tema tratado nelas, quando este órgão, por força das suas conveniências, certamente já trabalha com as próprias experiências, que hão de ser formuladas na adequação do sistema funcional das urnas eletrônicas.

O certo é que o general precisa compreender que a liberalidade do convite para as Forças Armadas integrarem a comissão de transparência eleitoral é apenas uma faculdade, que não oferece nenhuma garantia sobre a aceitação de sugestões para o aperfeiçoamento por elas imaginadas, uma vez que a prevalência e o controle desse aprimoramento são da exclusiva competência do Tribunal Superior Eleitora, que até pode aceitar algumas sugestões que não interfiram no núcleo do sistema, que parece que é o caso da preocupação central do general.    

Enfim, o valente e diligente general precisa reconhecer que perde seu precioso tempo, na certeza de que ele, nessas condições, por mais que se esforce, não vai chegar a lugar algum, uma vez que as suas preciosas sugestões não foram aproveitadas na forma  técnica recomendada, por meio de medida legislativa adequada, talvez por falta da necessária competência mesmo.

Pode-se até se indagar, diante desse visível estado de degeneração, em sendo verdadeira a existência das referidas fragilidades no sistema eleitoral brasileiro, se não seria possível corrigi-la antes das próximas eleições, a resposta e pronta e rápida, sim, por meio de intervenção no Tribunal Superior Eleitoral, com o afastamento da sua cúpula, passando o controle para do processo para os peritos criminais, com a experiência capaz de implantar o que for necessário para a eficiência desejável.

No estágio atual, isso não seria recomendável na vigência da pureza da democracia, em que as regras constitucionais vigentes são claras e precisam ser respeitadas, mesmo nas circunstâncias da prevalência de gritantes falhas no sistema eleitoral brasileiro, que não garante a regularidade do resultado das eleições, conforme mostram os fatos, em possível prejuízo para a integridade da própria democracia.   

Conclui-se que os órgãos competentes são capazes de apontar as deficiências e as vulnerabilidades do sistema eleitoral brasileiro, mas são completamente incompetentes para a adoção das medidas necessárias ao seu saneamento, no caso, por meio do menos recomendado caminho escolhido, com base no grito e na marra, quando tudo poderia ter sido resolvido facilmente pela via de normas legislativas pertinentes, dizendo precisamente como ele deve ser devidamente processado.  

Brasília, em 9 de julho de 2022

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