sexta-feira, 5 de maio de 2023

A impunidade?

 

Conforme notícia veiculada pela mídia, atendendo cobranças do presidente da Câmara dos Deputados, um dos principais líderes do Centrão, à vista das primeiras derrotas fragorosas no Congresso Nacional, o governo federal decidiu autorizar a liberação, pasmem, de R$ 3 bilhões do Orçamento da União, na área de Saúde.

Segundo o governo, a destinação dos aludidos recursos será definida em negociação com as bancadas estaduais no Congresso, evidentemente devidamente em concentração aos propósitos dos parlamentares que venderam seus votos para a aprovação da PEC da transição.

Os referidos recursos fazem parte do montante de R$ 9,8 bilhões resultantes do orçamento secreto de 2022, em que a sua destinação foi decidida entre os presidentes da Câmara e do Senado Federal, cujos valores foram convertidos em emendas parlamentares individuais impositivas, de modo que se promova a devida recompensa aos fiéis parlamentares que acudirem aos projetos do governo.

O Ministério da Saúde, para ser muito claro, informou que a liberação dos citados recursos estava prevista na PEC da Transição, que integravam o espólio do orçamento secreto, que tem funciona como instrumento para a negociação do apoio dos parlamentares, especialmente do Centrão, que ainda não tem um alinhamento definido, mas, mesmo assim, é certo que os congressistas mais fiéis ao governo vão ter acesso aos recursos.

Como essa situação é tão nebulosa que ainda não está claro se o governo vai dar transparência completa à destinação dos recursos, ou seja, se haverá identificação do parlamentar que indicou o destino da verba e quais serão mesmo as obras e os serviços a serem pagos com eles.

O certo mesmo é que o presidente da Câmara, um dos principais e influentes integrantes do Centrão, se reuniu, a portas fechadas, no Palácio do Planalto, com o presidente do país, notável especialista em compra de parlamentares, à vista do que já aconteceu com o famigerado escândalo do mensalão, que se queixou da lentidão do governo em liberar o dinheiro das emendas prometidas para a provação da “PEC da transição”, ou seja, nesse caso, houve o acerto de que é dando que se recebe, materializando a perfeita ação entre corruptores e corruptos.

Também é certo que a demora na liberação desses recursos propiciou a recente insatisfação dos parlamentares venais, que endureceram contra a votação de projetos de interesse do governo, que não teve outra alternativa senão a de reunir, em caráter de emergência, os seus principais ministros e ordenar que o problema fosse resolvido de forma rápida, conforme os resultados acima, com a liberação de parcela da propina combinada com os desavergonhados parlamentares.

Outro problema apontado pelos parlamentares, que ainda se encontra pendente das negociatas, é a lentidão para a efetivação das nomeações, nos segundo e terceiro escalões de órgãos públicos, em especial no âmbito dos estados.

Os auxiliares do governo admitem, evidentemente confirmando as falcatruas e corrupções envolvendo recursos, enormes dificuldades para o cumprimento de missão complicada para resolução, diante dos imbróglios em torno das nomeações e da liberação das emendas, em curto prazo, temendo ser decisivo e crucial para o governo, nas próximas votações no Congresso, dando a entender que parlamentares somente votam depois do recebimento das propinas combinadas.

Causa perplexidade a “honestidade” do governo em reconhecer a pouca-vergonha tanto por parte dele, que tem o disparate de comprar votos no Congresso, como dos parlamentares, que têm sim todo “direito” de endurecer quanto à aprovação de projetos do Palácio do Planalto, caso demore o repasse dos recursos envolvidos nas negociatas.

Nem se pode dizer que nunca se viu tamanha imundície na vida pública, porque isso nada mais, nada menos, é a repetição do deplorável esquema do mensalão, instituído na primeira gestão do atual governo, cujo desonesto exemplo de nada, absolutamente nada serviu para mostrar a imperiosa necessidade da observância das normas republicanas da moralidade e da honestidade, na aplicação dos recursos públicos, uma vez que os fatos se repetem em plena luz do dia.

 À toda evidência, não poderia haver nada mais cristalino no mundo da corrupção do que os fatos consumados entre as negociatas do governo com o Congresso, por meio da mais puríssima clareza possível, mostrando a falta de caráter público tanto por parte dele, que paga, por meio de verbas públicas, constantes do orçamento, tudo devidamente registrado, a compra dos votos necessários à provação de seus projetos, como dos desavergonhados e impudicos congressistas, que negociaram a sua consciência política, em somente votar por dinheiro sujo, conforme registram à luz solar o modus faciendi da absurda e indiscutível corrupção.

Diante de fatos estapafúrdios como esses, fica-se a imaginar a que mundo o Brasil chegou e se encontra, quando há clara consciência sobre o estupro dos salutares princípios fundamentais da moralidade, da probidade, da dignidade perante a sacrossanta administração pública, em que as suas entranhas são devassadas às claras, mas ninguém se apresenta para protegê-la da sanha dos aproveitadores e desonestos homens públicos?

Enfim, por andam, no presente momento tão aflitivo da história republicana brasileira, o Ministério Público, a outra parte do Congresso, em especial a oposição aos corruptos, a Justiça e os demais órgãos de controle e fiscalização da coisa pública, que têm importante missão constitucional de zelar pelo patrimônio dos brasileiros?

Também é preciso se indagar onde estão os meios de comunicação, tão ciosos no importante cumprimento do seu dever de informar e cobrar medidas moralizadoras das autoridades públicas, como forma do oportuno registro, por fazer parte da história, também os abusos na vida pública?

Por fim, cadê os verdadeiros brasileiros que sumiram neste momento crucial da vida político-administrativa do Brasil, quando ninguém aparece para repudiar, com veemência, a mais vil agressão aos princípios republicanos de uma nação, que queda indefesa diante da fúria desvairada dos ignóbeis homens públicos, quando conseguem transformar a nação em terreno poluído de negociatas com dinheiro público, em completo desrespeito à dignidade dos seus eleitores, pobres e ignorantes, que nada exigem para o saneamento da podridão que se alastra impunemente?

Brasília, em 5 de maio de 2023

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