Em vídeo que circula nas redes
sociais, alguém escreveu, mostrando as figuras de José Dirceu, Cesare Battisti
e Daniel Silveira, indagação se “Algum jurista consegue explicar isso: indulto
de José Dirceu e Cesare Battisti valeram, o indulto de Daniel Silveira não valeu?”.
Essa história tem as explicações a
seguir, conforme cada caso que se apresenta bem distinto um do outro e não
parece justa a generalização que se pretende dar ao desfecho de cada situação,
na forma da formulação escrita acima.
Pois bem, o perdão da pena ao
José Dirceu foi concedido por um ministro do Supremo Tribunal Federal, que
entendeu, por interpretação teleológica, que o criminoso atenderia aos critérios
estabelecidos no indulto natalino constante de decreto presidencial, tendo por
base princípios previstos na Constituição, com publicação anual, sempre por
ocasião dos festejos natalinos.
O aludido indulto prevê o perdão
da pena para condenados que se encaixam em pré-requisitos definidos pelo
Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, ou seja, é preciso que
seja réu primário e tenha cumprido um quarto da punição à qual foi condenado.
O ministro relator do caso escreveu
a seguinte justificativa: "Diante das informações prestadas pelo Juiz
Federal Sérgio Moro, da manifestação favorável do Procurador-Geral da República
e do preenchimento dos requisitos objetivos e subjetivos previstos na
legislação e no decreto específico, a hipótese é de concessão de indulto.
Trata-se de decisão vinculada a ser praticada por este relator, nos termos dos
precedentes do Plenário, sem margem para discricionariedade ou juízos
subjetivos".
No caso do italiano, não é verdade que o então
presidente da República tenha concedido indulto a Cesare Battisti, quando o certo mesmo é que o ato presidencial
foi no sentido de negar a extradição solicitada pela Itália, que é prerrogativa
do mandatário brasileiro.
Ou seja, não se tratou de ato de perdão ou
indulto à pena do italiano, mas sim de se negar a extradição dele para o seu
país de origem, conforme havia sido autorizado pelo Supremo.
Isso vale dizer que o caso do italiano difere da
situação de indulto, que é a extinção da pena aplicada a condenado à prisão,
enquanto a decisão presidencial brasileiro autorizou que o italiano
permanecesse no Brasil, evidentemente sem necessidade de cumprir pena no seu
país, onde foi condenado à prisão perpétua, por envolvimento em quatro assassinatos.
O
caso de Daniel Silveira, este sim, diz com o indulto concedido pelo presidente
da República, anulando, com base no art. 84, inciso XII, pena de prisão de oito
anos e nove meses aplicada pelo Supremo Tribunal Federal, pelos crimes de ameaça
ao Estado Democrático de Direito e coação no curso do processo.
A
validade do indulto concedido a Daniel Silveira foi anulada pelo Supremo, em
atendimento de pedidos formulados por alguns partidos políticos, cujos
fundamentos alegados por ministros da corte são elencados a seguir.
“Desvio
de finalidade na concessão, fundado em motivação política, fato ensejador da
sua nulidade; afronta à separação de poderes da República, pois teve como
objetivo exclusivo atacar decisão do Judiciário; atos atentatórios à democracia
e ao estado democrático de direito não podem ser objeto de indulto; indulto
deve ser coerente com finalidades humanitárias ou de interesse público, o que
não ocorreu nesse caso; indulto não pode ser instrumento de impunidade nem mensagem
a eventuais detratores da democracia de que podem continuar a praticar crimes; arrombamento
da discricionariedade pelo presidente, em forma de grave arbitrariedade.”.
Esses
e outros foram os argumentos principais dos ministros do Supremo, que se opuseram
ao indulto presidencial, mesmo que ele tivesse por fundamento dispositivo
constitucional, no caso subordinado à soberana interpretação dos ministros da
corte.
Na
verdade, no caso do ex-parlamentar, dificilmente o Supremo iria concordar com o
indulto presidencial, sob o argumento de que a sua decisão teve caráter
político e não humanitário, como deve ser a defesa da causa voltada para a proteção
do interesse público, quanto mais que o indultado teria agredido violentamente
a honra dos ministros que votaram pela condenação à prisão dele e por não aceitação
do perdão.
A
verdade é que, nesse caso, mesmo que haja recurso, a decisão do Supremo deve
ser mantida in totum, uma vez que se trata da discussão de objeto que
diz respeito à integridade dos próprios magistrados, que sempre vão encontrar
argumentos jurídicos para o rechaço das alegações do ex-indultado.
Enfim,
esses são os motivos, as justificativas e os resultados das causas questionadas
na inicial, cabendo ao juízo de valor pessoal sobre a validade jurídica das
medidas adotadas em cada caso, evidentemente sob o atendimento ou não aos fins colimados
pela justiça dos homens.
Brasília, em 7 de maio de 2023
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