segunda-feira, 15 de agosto de 2022

Mentalidade de estadista?

 

Tem-se visto o presidente da República se incomodar, constantemente, com o que as autoridades e a imprensa dizem sobre o governo, quando ele, sempre sem a menor tolerância costuma mostrar estupidez que não se harmoniza com a liturgia do relevante cargo presidencial.

O presidente do país pode até ter mentalidade de tudo, menos de estadista, que nem nas piores republiquetas alguém seria capaz de dizer piores asneiras, porque isso não condiz com a dignidade de verdadeiro estadista, que precisa ter o mínimo de equilíbrio e seriedade.

O ridículo  pior de tudo isso é que os assessores do mandatário o aplaudem, incentivando a incidência de atitude impensado e infantil, dando a entender que o governo poderia se preocupar com algo da maior importância do governo.

Aliás, não são somente os assessores que concordam que o presidente fique discutindo com autoridades da República, mas a grande maioria de seus fanáticos apoiadores também se impressiona com discurso absolutamente vazio e desnecessário dele, mesmo que isso não deva fazer parte do normal repertório inerente à comunicação oficial, que exige a rigorosa observância da liturgia de extremo respeito às relações de sociabilidade, em especial em se tratando de relações entre as autoridades da República, em que o nível de respeito precisa se manter no patamar da relevância dos cargos por elas ocupados.

É com tristeza que existam discursos presidenciais como esses fora da liturgia, por se imaginar a enorme dificuldade para o Brasil em atingir o nível de civilidade desejável, no seio do governo.    

Certa feita, uma distinta amiga discordou do meu texto, tendo escrito a seguinte mensagem: "’Cala boca sim...’ esses togados não podem ficar interferindo na vida do Executivo... não querem deixar o homem trabalhar.  E é uma demasiada interferência do Judiciário no executivo, no Legislativo. Juiz tem que se limitar a responder ou dar opinião nos Autos... Hoje o que mais se vê é juiz dando opinião na mídia do que nos autos. Os tocados, estão sendo polícia, promotor e juiz ao mesmo tempo, fugindo das suas atribuições constitucionais. É sim, a ‘ditadura da toga’. prendem julgam e sentenciam, sem o Direito da Defesa prévia. O presidente tem razão! E se fosse eu no lugar dele, já teria colado as FFAA para cima desse pessoal colocado os no lugar deles... E quisera eu, fazer parte das fileiras das FFAA e ter o prazer de ser convocado para a luta.  Mas parodiando, apenas um ‘Cabo e um soldado’ são  suficientes para o ato.”.   

Em resposta à aludida mensagem, eu disse que me referia à dignidade do país, onde os poderes são autônomos e independentes, em que as autoridades precisam se comportarem sob o pálio dos princípios da civilidade e da cidadania, sem necessidade alguma de críticas e agressões, como vem acontecendo com constância, nesse governo.

Mandar calar a boca é próprio de ditadores, que não respeitam princípios republicanos e de civilidade.

Nos países sérios, evoluídos e civilizados, em termos políticos e democráticos, as questões entre os poderes são resolvidas na via da tolerância, do diálogo e da racionalidade, em que a parte que se achar prejudicada interpõe recurso na via competente, na tentativa de se resolver as querelas, na via judicial, da melhor maneira possível.

Não há a menor necessidade de o presidente do país querer ficar se passando, a todo momento, por vítima e injustiçado, como se ele fosse um coitadinho do pato feio da República.

Na verdade, ele não passa de eterno medroso, que vem ameaçando, mas não tem coragem para adotar absolutamente nada, como forma de saneamento daquilo que ele entende que está errado, a exemplo do seu calcanhar de Aquiles, que é o sistema eleitoral brasileiro, ou mais especificamente o funcionamento das urnas eletrônicas.

Como se vê, mandar calar a boca somente agrada aos apoiadores do presidente do país, que comungam com o mesmo pensamento dele, cujo fato somente contribui para aumentar as dificuldades de relacionamento entre as autoridades dos poderes da República, em claro detrimento dos interesses nacionais.

É preciso se lamentar espetáculos que não levam a lugar algum, senão para aumentar as dificuldades e os impasses onde se exige aproximação e convergência, que são necessárias para a facilitação das questões nacionais.

Nessa mesma linha de defesa do presidente do país, outra amiga disse que a pessoa que foi ferida com facada, em nome dos brasileiros, tem direito de dizer o que bem entender, inclusive mandar autoridades calarem a boca.

Em resposta a essa inaceitável presunção, eu disse que isso não teria o menor cabimento de se vincular facada na barriga com princípios de civilidade, diante da impossibilidade de se encontrar mínimo liame entre os fatos, uma vez que a fachada foi caso fortuito, meramente circunstancial, absolutamente desvinculado da gestão pública, enquanto mandar calar a boca diz, na essência, com a visível demonstração de falta de educação e respeito, além de evidenciar incompetência para conduzir com a devida eficiência as questões de interesse do Estado, que exige ponderação, tolerância e equilíbrio.

Quando se manda alguém calar a boca e agride as autoridades, fica muito evidente a falta de argumentos, preferindo resolver as questões na base do grito, da força bruta, na intimidação, que se mostra o pior caminho para a solução das questões e demandas, exatamente porque o bom senso e a racionalidade aconselham que o diálogo respeitoso e de alto nível precisa estar presente na mesa das negociações.

A propósito, convém lembrar que mandar alguém calar a boca é agressão verbal que significa forma direta de censura e de cerceamento da liberdade de expressão, que somente conspira contra os sagrados princípios constitucionais da liberdade de pensamento, fato que não condiz com a evolução da humanidade nem com os seus princípios.

O presidente do país tem todo direito de se indignar contra os procedimentos de seus arqui-inimigos, porque isso é normal, diante das decisões monocráticas e inconstitucionais que são proferidas, mas isso não justifica que ele possa sair do prumo, para agredir, quando o normal, caso seja necessário, é a impetração de recursos pertinentes, por parte de quem for prejudicado, ante a impossibilidade de outra solução civilizada.

O presidente do país tem o direito de apresentar recurso ao plenário do Supremo, argumentando as inconsistências e até os abusos de poder, por notórios desmandos nas decisões, sem necessidade de se expor ao público de maneira deselegante e deseducada, quando se manda alguém se calar, porque isso não se harmoniza com a relevância da liturgia do cargo presidencial.

Uma terceira pessoa, fez questão de lembrar outro ponto em favor do presidente do país, tendo afirmado o seguinte: “Adalmir, contra as barbaridades que esse senhor (se referindo ao ministro do Supremo) vem praticado *não há argumento algum!* Vamos pegar o caso do Deputado Federal Daniel Silveira. Mesmo não concordando com a fala do Daniel Silveira, abstraindo o que ele falou a respeito de alguns Ministros, já foram tantas arbitrariedades contra ele, inadmissíveis partindo da mais alta Corte de Justiça. Prisão em flagrante por um vídeo gravado… até quando seria flagrante? Um ano, dois anos… um absurdo. Ahhh, prisão após horário noturno permitido. Pagamento de fiança estipulada pelo Ministro… mas a conta judicial estava encerrada, impossibilitando o depósito. Multa arbitrada em 15 mil reais por dia e bloqueio de contas e de bens sem previsão legal alguma, da cabeça dele. Isso foi o que lembrei, por alto.”.

          Em resposta a essa mensagem, eu disse que é bom ficar bem claro que nada se resolve na base do grito e ninguém ganha ou convence na pancada, no revide, na bala.

No Estado Democrático de Direito, só existe um único caminho, que é a via do diálogo, da negociação inteligente, por meio de recursos pertinentes, métodos estes que não se vislumbram para o presidente do país, que os desconhece, ou simplesmente prefere ignorá-los para se beneficiar com seus incontáveis "minimis", para a configuração do massacre de injustiçamento à pessoa dele, que ainda é apoiado e aplaudido por isso, por seus fiéis seguidores, em forma de confirmação do martírio dele.

Desde o início do governo, o presidente do país elegeu o bate-boca, a crítica, a agressão, o ataque, tudo em conformidade com plano estratégico de vitimização e injustiçamento, para que ele pudesse obter dividendos políticos e teve absoluto sucesso na sua empreitada, porque seus apoiadores estão sempre ao seu lado, no cercadinho ou fora dele.

Se ele tivesse ficado calado, desde o início, apenas impetrando os recursos necessários, em cada caso, certamente que o Supremo os acolheria e já teria colocado o ministro considerado algoz no seu devido lugar de insignificância, mas, ao contrário disso, as questões somente de acumularam e saíram fora de controle.

No estado democrático, caracteriza barbaridade o presidente da República chamar um ministro de filho da  "p...", como aconteceu em relação ao presidente do Tribunal Superior Eleitoral, mandar um ministro do Supremo calor a boca, chamar os brasileiros de maricas e tantas outras deselegâncias e descortesias que os fiéis apoiadores dele nem percebem e não vão perceber nunca tais deslizes, por apenas notarem, por conveniência, que ele é verdadeiro gentleman e assim mesmo deve se comportar.

Na verdade, é preciso que o estadista cuide exclusivamente das funções inerentes ao cargo presidencial, sem se preocupar se os outros poderes cumprem ou não as suas missões constitucionais.

No caso de interferência de outro poder no Executivo, o estadista não precisa se expor ao ridículo com discussões improdutivas, quando existe o caminho inteligente e eficiente do recurso, onde, por meio do qual, são expostas as argumentações jurídicas, normalmente com capacidade para a demonstração das inverdades constantes das decisões judiciais proferidas em contrariedades aos princípios constitucionais.

Enfim, o estadista competente, eficiente e responsável jamais perderia seu precioso tempo batendo-boca, agredindo e criticando, em especial porque a relevante função presidencial certamente deve ter assuntos da maior importância do que se rebaixar ao nível de ministro que somente merece o desprezo dos brasileiros, pelos tanto de decisões absurdas adotadas por ele.

Ante o exposto, convém ficar muito claro, diante dos sagrados direitos de manifestação e expressão, a importância do respeito às opiniões de quem raciocina diferente, uma vez que cada pessoa tem a sua verdade e pode pensar como bem quiser, sabendo que ruim mesmo, no regime democrático, é não ter opinião sobre nada.

          Brasília, em 15 de agosto de 2022

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