Vem
circulando nas redes sociais mensagem que analisa a possibilidade de o presidente
do Senado Federal assumir a Presidência da República, a partir do início do
período que compreende a campanha eleitoral, porque o titular seria obrigado a
se afastar do cargo, para cuidar da sua reeleição.
Nesse
caso, o presidente da República interino passaria a ter competência com amplos
poderes, inclusive para adotar medidas como o fechamento do Supremo Tribunal
Federal e a substituição dos ministros, segundo a ideia forjada pela referida mensagem.
Não
obstante, de acordo com o art. 82 da Constituição, "O mandato do
presidente da República é de quatro anos e terá início em 5 de janeiro do ano
seguinte ao de sua eleição.".
Como
se vê, não existe, nesse texto, qualquer obrigatoriedade para o afastamento do presidente
da cargo, para quem quiser se candidatar à reeleição.
Isso
vale dizer que todas as premissas delineadas pelo articulista caem por terra,
não tendo a menor validade o esforço argumentativo exposto em longa explanação,
inclusive de medidas antidemocráticas, como aventado acima.
De
outra feita, também não passa de perda de tempo em se invocar algum poder do
povo para se exigir algo de algum poder da República, como a adoção de qualquer
medida, sob o argumento de que emanado algum poder dele, porque isso não passa
de falácia, quando o único poder que o povo tem escrito na Constituição consta
no parágrafo único do art. 1º, que diz exatamente o seguinte: "Todo o
poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou
diretamente, nos termos desta Constituição.".
Ou
seja, o povo só tem poder para votar e nada mais, porque o seu poder se encerra
ao voto, que elege o seu representante legal, que sequer fiscalizar pode por
quem votou nele, exatamente por faltar amparo legal.
Essa
história de se alardear que o povo pode exigir mudanças de alguma coisa dos
poderes da República não tem qualquer sustentação jurídica.
É
preciso que qualquer ato tomado por autoridade seja assumido por ela, com base
na sua competência constitucional, porque ele poderá apenas ser apoiado pelo
povo, mas nunca respaldado legalmente por ele, como se existisse poder emanado por
ele, uma vez que isso inexiste na Constituição.
Ou
seja, não passa de perda de tempo as pessoas irem para ruas, sob multidões,
porque o seu apelo não tem ressonância jurídica.
Se
o povo tivesse algum poder, o presidente da República não teria feito o
grosseiro papelão pós 7 de setembro do ano passado, quando ele pediu que o povo
fosse às ruas, que ele faria o que o povo quisesse.
Realmente,
o povo foi às ruas e disse o que queria, que foi o fechamento do Supremo, sob o
embalo da conversa mentirosa do presidente de que ele não mais atenderia decisão
de um ministro daquela corte, que depois, frustrando às expectativas do povo,
voltou atrás e ainda beijou as mãos do ministro, ante o pedido de desculpas, dizendo
que havia errado e pediu perdão, prometendo fazer as coisas certas, cujas
promessas foram mandadas para o espaço sideral, em harmonia com o seu gênio
impulsivo de pura rebeldia.
Agora,
qualquer reincidência dos fatos poderá ser mera coincidência, porque ele também
voltou a pedir que o povo vá às ruas, só não teve a ingenuidade de afirmar,
ainda, que faz o que o povo quiser, porque ficou muito feio para ele, no ano
passado, depois de prometer e nada fazer.
Enquanto
houver ingenuidade do povo, que ainda acredita em conversa de políticos, este
país nunca será consertado, porque as promessas deles nem sempre são cumpridas
nem levadas a sério, mesmo poque o povo nada exige e se logo se esquece delas.
Enfim,
não passa de pura cretinice se atribuir ao dispositivo constitucional efêmero
poder ao povo, porque ele não existe, a não ser para eleger seu representante
político, que passa a exercer o efetivo poder, ou seja, o poder é muito
importante, tanto que só existe pela existência do povo, que termina, depois de
votar, sem nenhum poder para decidir em defesa de seus direitos políticos e cívicos.
Como
se percebe facilmente, esse fato termina sendo verdadeira incoerência, quando,
por instante, o poder do povo vale muito, somente na hora do voto, sendo de
suma importância, com influência decisiva na governança do país, mas logo
depois, no final das contas, não vale absolutamente nada.
Convém,
por que as circunstâncias da atualidade contemporânea já exigem medidas
coerentes com a realidade política, que o povo tenha realmente condições de
influenciar na vida política brasileira, de modo que possa prevalecer a sua soberana
vontade à altura da sua importância como a célula-mater da pátria, a razão
primacial do Estado, que precisa sim ter poder suficiente, em consonância com
os princípios democráticos, para decidir sobre os assuntos importantes do
Brasil, que também seja do seu benefício cívico-político.
O
certo é que, na forma constante do texto constitucional vigente, que diz muito
claro que o povo somente tem poder para votar, para eleger, sem nenhuma outra atribuição
cívica, somente leva ao ridículo de se imaginar que ele pode tudo, diante da
expressão “o poder emana do povo”, mas, na verdade, o poder é exercido por seus
representantes legais, ou seja, na prática, o povo não tem poder de nada,
porque, no final, quem tem o poder é aquele que ele elege, que, por conta
disso, também não tem vínculo nenhum com o povo, depois de eleito.
Dessa
forma, urge que o povo exija a mudança da Constituição, em especial no que se
refere ao texto constante do parágrafo único do artigo 1º, para os necessários
aprimoramento e atualização, no sentido de que fique muito claro o seu enunciado,
em condições de firmeza quanto ao verdadeiro poder de cidadania atribuído ao
povo, nos seguintes termos: “Todo o poder emana do povo, por meio da eleição
de seus representantes políticos, da fiscalização política sobre estes e, em
especial, do oferecimento de medidas com vistas à modernização e ao aperfeiçoamento
da administração pública.”.
Brasília,
em 9 de agosto de 2022
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