sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

A nebulosidade das versões

A força-tarefa da Operação Lava-Jato afirmou, depois de acurada análise dos documentos pertinentes, que, “Diante das tão clamorosas evidências da falsidade ideológica dos documentos impugnados neste incidente, ora destacadas, compreende-se porque a defesa do arguido, como é visível, tenha ido construir a fantasiosa e inverossímil versão sobre o ‘encontro’ dos recibos em sua residência, que não convence ninguém, consoante pormenorizadamente abordado na manifestação ministerial do evento 31, à qual ora aqui se reporta, sendo, assim, pois, irretorquível que o arguido fez uso de recibos ideologicamente falsos na ação penal de que se trata, documentos que foram ardilosamente produzidos para dar falso amparo à simulada locação, que é um dos expedientes de dissimulação da real propriedade do apartamento nº 121 de LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA”.
O Ministério Público concluiu sua manifestação, afirmando: “Ademais, em vista do farto acerto probatório que atesta a ausência de relação locatícia real, deve ser dito o óbvio, em resposta à tentativa insistente e precária da defesa de provar a existência de pagamentos única e exclusivamente invocando a força probatória atribuída pela lei civil a recibos de pagamentos: documentos ideologicamente falsos não fazem prova de pagamento ou quitação. Ao contrário, a falsidade do recibo concorre francamente para confirmar os matizes criminosos dos atos que tentam, em vão, lastrear”.
O primo do pecuarista amigo do ex-presidente é denunciado por ser o suposto laranja do político, na aquisição dos questionados terreno e apartamento.
O ex-presidente apresentou os recibos de pagamento assinados pelo suposto laranja, mas o Ministério Público Federal investiga a autenticidade dos documentos.
O suposto dono do imóvel tem afirmado que, em dezembro de 2015, foi visitado por um advogado do político, no hospital Sírio Libanês, com a promessa do pagamento do aluguel do apartamento 121 do condomínio Hill House, ocupado pelo ex-presidente.
O suposto dono do imóvel disse que um dia depois de receber o advogado do político, ele teria sido visitado por um contador, que conduzia os recibos para serem assinados de uma só vez.
Registros do hospital revelam que o suposto dono do imóvel foi visitado três vezes pelo contador, mas não há registro da entrada do advogado no aludido hospital, para visitá-lo.
A força-tarefa da Lava-Jato ressalta que o suposto dono do imóvel recebeu ligações do advogado, em datas próximas do dia em que os papéis foram assinados.
A defesa do político afirma que o Ministério Público Federal abusa do direito de acusar e reforça a prática do “lawfare” contra o seu cliente, por ter concluído pela falsidade dos recibos de locação em questão, a despeito da comprovação de que os documentos são autênticos e idôneos e contêm declaração de quitação dos aluguéis entre 2011 e 2015.
Ao invés de reconhecerem a improcedência da acusação, os procuradores passaram a colocar indevidamente sob suspeita a autenticidade dos recibos, passando a sustentar que eles seriam “ideologicamente falsos”, pois, segundo a versão apresentada, os aluguéis não teriam sido efetivamente pagos, com o que não concorda a defesa, por considerar que a acusação é inverídica e descabida.
A defesa conclui afirmando que “Lula não praticou qualquer ato ilícito, antes, durante ou depois do exercício do cargo de Presidente da República.”.
A situação que envolve a propriedade do questionado imóvel parece bastante complicada, porque ele teria sido comprado com o dinheiro ganho, pelo hipotético dono, pelo seu trabalho de corretagem supostamente arranjado na compra de outro imóvel, que seria destinado à sede do Instituto Lula, cuja transação foi efetivada, mas posteriormente desfeita, em face de falta de regularidade da sua escritura.
Só que a corretagem teria sido inventada para sustentar a compra do citado apartamento 121, em nome do suposto dono, mas o Ministério Público garante que ele pertence ao ex-presidente e não àquele proprietário que consta da escritura.
          Enquanto não havia questionamento sobre a propriedade do referido apartamento, o ex-presidente teria deixado de pagar o aluguel, que vinha sendo ocupado por ele, apenas por força de contrato de aluguel, também forjado, segundo o Ministério Público.
Depois do questionamento feito pela Operação Lava-Jato, surgiram os recibos sobre os pagamentos do aluguel, no período de 2011 a 2015, mas o Ministério Público garante que os documentos são “ideologicamente falsos”, partindo-se do pressuposto de que o hipotético dono do imóvel garantiu, em juízo, que não recebeu um tostão com relação ao aluguel e que também não teria reclamado com relação a esse fato, embora ele tivesse declarado à Secretaria da Receita Federal, evidentemente para dar ideia de legalidade sobre os aluguéis, o recebimento dos valores pertinentes e isso evidencia crime de falsidade ideológica.
Ao que tudo indica, os documentos até podem ser autênticos e verdadeiros, no sentido puramente material, mas completamente invalidados, em termos jurídicos, como comprovantes da transação comercial, em que o suposto dono do imóvel garante que não viu a cor do dinheiro a que se referem os recibos, ou seja, ele disse ao juiz que não recebeu nenhum pagamento, havendo, nesse caso, falsidade ideológica com a finalidade claríssima de ludibriar, primeiro, o fisco, para maquiar uma situação inexistente, e, segundo, a Justiça, para mostrar que foram feitos os pagamentos indicados neles e com isso indicar que o imóvel pertence àquele que consta na sua escritura.
Nesse imbróglio, há nítida convicção de que alguém mente muito feio, para tentar construir fato jurídico capaz de convencer a existência de algo sem muita consistência, eis que a materialidade das provas é duvidosa e de pouquíssima plausibilidade, pondo lenha no fogo do mar de incertezas, tanto quanto à propriedade do questionado imóvel, diante da suspeita de arranjo na corretagem, como nos pagamentos dos aluguéis, quando o beneficiário garante que não teria recebido qualquer valor, no período apontado.
Em se tratando do envolvimento de importante homem público nesse imbróglio, é natural que os brasileiros tenham demonstrado o maior interesse de que a Justiça possa desvendar mais essa difícil demanda, eis que a verdade sobre os fatos precisa vir à tona, para que se possa dar credibilidade a quem realmente estiver com a razão, em que pese a nebulosidade reinante nas alegações entre as partes. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 19 de janeiro de 2018

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