terça-feira, 23 de janeiro de 2018

Revogação de mandatos políticos

Nos termos da Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que está em análise na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal, a maioria absoluta de eleitores poderá pedir a revogação de mandatos de políticos eleitos pelo voto majoritário.
A referida proposta recebeu parecer favorável do relator na comissão e aguarda a votação naquela comissão.
A aludida PEC, de autoria de um senador pedetista do DF, permite a realização do chamado recall do mandato de governadores, prefeitos, senadores e do presidente da República, bem assim dos vices ou suplentes com eles eleitos.
Segundo o senador, o novo dispositivo constitucional, se aprovado, é aplicado “quando o eleitorado entender que o mandatário perdeu a confiança do povo, por alguma causa grave relacionada ao seu governo, ao seu desempenho pessoal ou outra a critério da soberania popular”.
O referendo procedimento revogatório será aplicado quando, por iniciativa de 5% dos eleitores da respectiva circunscrição eleitoral do político que perder a confiança do povo.
          O objetivo da medida em tela é impedir que o recurso constitucional seja “banalizado e utilizado como instrumento de destituição do eleito por razões de mera oposição”.
A consulta popular deverá ser conduzida pela Justiça Eleitoral e será “precedida de amplo debate público”.
A PEC estabelece que, caso 50% dos eleitores votantes no referendo sejam favoráveis à revogação, a cassação do mandato será aprovada.
O fim do mandato eletivo do político alcançará, conforme o caso, também o mandato do seu vice ou suplente.
Por seu turno, caso o pedido de recall seja rejeitado, o mesmo mandato eletivo não poderá ser objeto de outra consulta com a mesma intenção.
O autor da PEC ressalta, na justificativa da proposta, que o recall é um recurso previsto no direito estadunidense, mas a alternativa de revogação existe em outros países e dá ao eleitor o “direito de se arrepender”.
Segundo o autor da ideia, “Precisamos dar ao eleitor esse instrumento (de revogação). Não podemos ficar apenas na possibilidade de um difícil, complicado e arriscado impeachment feito pelos parlamentares. A ideia é que a população possa fazer isso quando achar necessário.”.
O senador declarou ainda que o ideal seria a realização do referendo de revogação até a primeira metade do mandato do político, mas o texto não estabelece prazo para que a população se mobilize para pedir o recall.
Na justificativa da proposta, seu autor afirma que a PEC não se aplica aos mandatos dos deputados, em razão de que, no Brasil, o sistema proporcional utilizado para as eleições deles permite a eleição de candidatos minoritários.
Segundo o senador, se esses mandatos fossem incluídos nas previsões da emenda, haveria a possibilidade de que “maiorias políticas excluíssem a representação parlamentar de minorias, o que entraria em choque com a própria lógica do sistema de representação proporcional e, no limite, com o próprio pluralismo político”.
A PEC também estabelece que, se promulgada pelo Legislativo, a proposta entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando aos mandatos em curso dos atuais governantes e senadores.
O Plenário também deverá votar, em dois turnos, outra PEC que permite a revogação do mandato do presidente da República pela população, sendo que esta diz que o recall depende das assinaturas de 10% dos eleitores que compareceram à última eleição, distribuídas em pelo menos 14 estados e não menos de 5% em cada um deles.
A proposta estabelece que a iniciativa de revogação será apreciada pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, separadamente, e, para ser aprovada, precisará do voto favorável da maioria absoluta dos membros de cada uma das Casas e, em caso de aprovação, será então convocado referendo popular para ratificar ou rejeitar a medida.
No Estado Democrático de Direito e conforme preconiza a finalidade a que se propõe a medida, não se pode delimitar a quantidade de quantas vezes se possa aplicar o dispositivo para o mesmo político, salvo para a mesma situação, mas em caso diferente, se o povo entender que ele perdeu a confiança, por motivo diverso, não importa quantas vezes, mas sim a finalidade objetivada por ela, que é afastar o mal pela raiz, tantas vezes quantas necessárias, desde que o mesmo político consiga driblar, evidentemente as tentativas anteriores. 
Também não faz o menor sentido qual o momento que a norma possa ser aplicada, se no início, no meio ou no fim de seu mandato, porque o importante mesmo é que o recall seja feito e a norma cumpra a sua principal função de afastar da administração público quem seja realmente péssimo exemplo para a sociedade e ainda contribua para o estorvo às medidas pertinentes à satisfação do interesse público.
O princípio que deveria prevalecer seria a automática aplicação da norma do recall quando o político cair em desgraça e demonstrar que ele é erva daninha que prejudica a classe política, não importando que ele seja deputado federal, estadual, distrital ou ainda vereador, além dos casos já mencionados, porque, em se tratando de medida indiscutivelmente democrática, ela precisa ser aplicada de forma abrangente, sem exceção, incluindo toda classe política, indistintamente, porque, quem não presta, tem é que ser descartado mesmo, desde o presidente da República até o vereador, mesmo porque, com o estabelecimento de regra dura, com a perda do cargo, em razão da desconfiança ou da perda de confiança, os homens públicos vão se esforçar para não caírem em desgraça, sob a ótica do seu eleitorado, ou seja, os políticos vão se policiar para evitar a guilhotina.
          Ademais, na administração pública, é princípio fundamental o estabelecimento da condenação de privilégios, quando o senador pode perder o mandato, i.e., tem seu cargo passível de cassação, porque caiu em desgraça, sob a visão do eleitor, mas o deputado, que incidiu em falha similar, com enquadramento nas mesmas características da perda de confiança e também tenha se tornado indigno de representar o povo, mas não pode passar pelo saudável recall, exatamente porque foi isentado pela norma constitucional injusta e discriminatória, em clara demonstração de privilégio indevido e certamente imerecido, em se tratando de  exercer cargo público, passível de igual censura por parte do povo, que elege igualmente os parlamentares.
Convém que se estude a possibilidade de essa norma jurídica poder alcançar mandato de quem não tenha sido eleito, com o voto direto, como no caso do atual presidente da República que foi eleito indiretamente, ou seja, ele foi eleito na chapa do PT, não tendo recebido voto para o cargo que exerce e, nesse caso, a norma é omissa, ou seja, à luz da norma em comento ele, na atualidade, não é alcançável.
A norma diz que a medida alcança também o vice, mas o vice, no caso do atual presidente, não é mais vice, porque de vice ele deixou de ser há algum tempo e agora é o presidente do país, que não foi eleito para tanto, embora a função do vice seja a de substituir o titular.
De qualquer forma, há toda compreensão de que, sendo uma norma moralizadora, que estaria vindo com até bastante atraso, ela jamais será aprovada pelo Congresso, porque o seu objetivo é impedir que a incompetência e a indignidade perpetuem na administração pública e a forma de saneamento pretendida não se coaduna com a mentalidade dos congressistas que são muito mais pelos conservadorismo e corporativismo protecionistas, mesmo em prejuízo do interesse público, a exemplo do que aconteceu com o presidente do país, que conseguiu, por via do Congresso, se salvar de duas denúncias com base em fatos de corrupção e outros crimes contrários aos princípios republicanos, que jamais seriam arquivadas se elas ocorressem em um país sério, civilizado e evoluído, em termos políticos e democráticos.
Convém que os parlamentares possam se interessar realmente pelo aprimoramento e pela modernização do ordenamento jurídico, nos termos da Proposta de Emenda à Constituição em referência, que precisa ser melhorada, quanto à sua abrangência, de modo que a sua aplicação tenha por escopo a implementação do verdadeiro sentimento da responsabilidade cívica dos homens públicos, no sentido de se obrigar a cumprir fielmente não somente o mandato para os quais eles tenham sido eleitos, mas também o dever de ser exemplo de trabalhador profícuo e assíduo, sob o primado dos princípios republicanos e democráticos, nos termos do compromisso normalmente demandado na campanha eleitoral. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 23 de janeiro de 2018

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