sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

Esculhambação orçamentária

Com a finalidade de se evitar que o presidente da República seja acusado de crime de responsabilidade, a equipe econômica estuda a elaboração de proposta de emenda à constituição, para amenizar a conhecida "regra de ouro", que impede a União de emitir dívida em volume superior a investimentos e custeio.
A proposta foi discutida, em caráter de urgência, em reunião entre o presidente da Câmara dos Deputados e o ministro da Fazenda, ambos cotados para serem candidatos à Presidência da República, além dos ministros do Planejamento e das Cidades.
O objetivo da regra é evitar que o Estado se endivide demais para pagar despesas correntes, como gasto com pessoal e conta de luz, empurrando a conta para outros governos.
A PEC em estudo, que já tem até relator, que é deputado federal pelo MDB-RJ, permite que a regra vigente seja descumprida sem que isso seja considerado crime de responsabilidade, ou seja, trata-se de mais um golpe à moralidade, com o beneplácito do jeitinho brasileiro.
Segundo foi apurado, a proibição existente vigente será substituída por outra, como a criação de novas despesas obrigatórias, como contratações ou reajustes salariais - os mesmos mecanismos corretivos que entram em vigor se o teto de gastos for descumprido.
Essas sanções também valerão para Estados e municípios que descumprirem as regras, ou seja, a pouca-vergonha será compartilha entre as unidades da federação, para que ninguém se sinta prejudicado.
O texto ainda está sendo elaborado em parceria com técnicos da Câmara e dos Ministérios do Planejamento e da Fazenda.
Por enquanto, ainda não foi definido se as novas regras teriam eficácia já neste exercício ou se valeriam somente a partir de 2019, com o novo presidente eleito.
Um economista da consultoria Tendências disse que a "A solução por mudar a regra do jogo reforça quão enroscado o governo está no quesito fiscal. A ‘regra de ouro’ passou a se tornar um problema à medida que o déficit foi se ampliando e gerando nova dívida. Como a fonte do déficit decorre muito do crescimento de gastos correntes obrigatórios, forçando o corte nos investimentos, então de certa forma faz sentido buscar soluções que ataquem a fonte do problema: o crescimento dos gastos obrigatórios".
Ele ressaltou que mudanças de regras no meio do jogo sempre parecem "problemáticas. O problema aqui é que, enquanto não se resolve a fonte do problema, não se cura o paciente, por mais que se tente recuperá-lo", fazendo alusão à necessidade de aprovação da reforma da Previdência e reversão de desonerações tributárias.
Segundo opinião do mercado, o risco de descumprimento da “regra de ouro” aumentou com o agravamento da situação fiscal, em que, de um lado, o governo tem emitido mais títulos para financiar despesas e, de outro, foi obrigado a cortar drasticamente os investimentos públicos, uma das poucas despesas que pode manejar sem mudanças na legislação.
De acordo com o Tesouro Nacional, em 2017, a situação deficitária foi resolvida com o retorno de R$ 50 bilhões do BNDES aos cofres do Tesouro, mas, em 2018, esse descompasso alcançará os R$ 184 bilhões.
Sem previsão de devolução de recursos do banco, neste ano - o pedido é por R$ 130 bilhões adicionais, o que ainda está em negociação -, não se vislumbra solução para o grave problema orçamentário.
O diretor do BNDES afirmou, no início deste mês, que se tiver que repassar recursos ao PIS/Pasep e ao FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), o banco não terá como devolver ao governo federal os R$ 130 bilhões aguardados em 2018.
Ele disse que o BNDES tem que repassar, no corrente ano, cerca de R$ 70 bilhões ao FAT e ao PIS/Pasep, tendo concluído que "A devolução ao FAT é uma decisão institucional e, no caso do PIS/Pasep, depende do volume de saques que até agora está baixo". Com informações da Folhapress.
Não é de agora que as contas públicas passam por solavancos e compressões decorrentes da frouxidão dos gastos desenfreados de governos incompetentes e irresponsáveis, que gastam além das previsões orçamentarias, por absoluta incúria, quando eles precisam se ajustar aos termos dos princípios imperativos da economicidade e da extrema contenção de despesas, de modo a cortar na própria carne, promovendo os ajuste e as economias com vistas exclusivamente a cumprir as exigências da legislação de regência.
Não deixa de demonstrar cristalina incompetência o governante que, no momento do aperto orçamentário, simplesmente recorre à solução simplista, de menor esforço, que é o que o presidente mais impopular da história brasileira resolve promover, com a eliminação da regra que pune com a perda do cargo o gestor público que incorre no crime de responsabilidade, ou seja, gasta mais do que o permitido pelo Congresso e continua descumprindo a regra imperativa, quando deveria adotar revolução nos gastos públicos, como forma de se ajustar aos limites constitucional e legal, ao  invés de tentar resolver o problema por medida legislativa, permitindo que os rombos continuem normalmente.
Urge que o Congresso Nacional, onde ficam os ditos lídimos representantes do povo, tenha a majestosa dignidade de sequer aceitar essa indecente Proposta de Emenda à Constituição, deixando de receber medida que se traduz em verdadeira esculhambação, em termos de desmoralização da execução dos orçamentos públicos, e, ao devolvê-la para a origem, se afirmar que os brasileiros exigem que o governo se conscientize sobre a urgentíssima necessidade de ajustar as contas públicas, como fazem os países sérios, civilizados e evoluídos, em termos políticos e democráticos, exatamente ao limite da arrecadação das receitas, de modo que as despesas públicas passem imediatamente ao devido processo de depuração e contenções necessárias e cabíveis aos termos da legislação aplicável às normas de execução orçamentária e financeira do país. Acorda, Brasil!
ANTONIO ADALMIR FERNANDES

Brasília, em 5 de janeiro de 2018

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